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Guatemala: Prisão de conhecido jornalista crítico ao governo reflete cerco à imprensa no país

O fundador do El Periódico na Guatemala, o jornalista José Rubén Zamora Marroquín, deverá  cumprir seis anos de prisão, conforme determinação de um tribunal nesta quarta-feira(14). A condenação do renomado profissional, ferrenho crítico do governo de Alejandro Giammattei, reflete o crescente cerco contra a imprensa no país.

O fundador e editor do jornal El Periodico Jose Ruben Zamora sai algemado após uma audiência judicial na Cidade da Guatemala, quarta-feira, 14 de junho de 2023.
O fundador e editor do jornal El Periodico Jose Ruben Zamora sai algemado após uma audiência judicial na Cidade da Guatemala, quarta-feira, 14 de junho de 2023. AP - Santiago Billy
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Juan Pablo Lucumi, da RFI em espanhol, com EFE, AP e veículos locais

O jornalista guatemalteco foi condenado por um colegiado de três juízes em um caso de lavagem de dinheiro. O processo tem sido marcado por irregularidades e é criticado por entidades internacionais. A sentença foi denunciada pelo procurador especial Rafael Curruchiche, que deixou claro que seu grupo de advogados vai recorrer da decisão e pedir que Zamora seja condenado a 40 anos de prisão, conforme solicitado pela procuradoria.

Zamora ainda deve responder à Justiça por um caso de obstrução de ação penal e outro por falsificação de documentos imigratórios.

"Sou inocente dos crimes. Continuo sendo inocente e ele [Giammattei] continua sendo um ladrão", disse o jornalista após ouvir a sentença. O documento também informava que ele foi absolvido dos crimes de chantagem e tráfico de influência, dos quais era acusado.

“Todos os meus direitos foram violados, inclusive o direito de defesa. Trataram-nos como animais, destruíram provas”, acrescentou, em alusão ao fato de que vários dos seus advogados de defesa haviam sido detidos durante o período de instrução do processo.

Segundo ele, quatro de seus advogados foram acusados ​​e processados ​​pelo Ministério Público e outros dois foram forçados a se exilar do país devido a várias ameaças.

Já a 8ª Vara de Execuções do Poder Judiciário da Guatemala defendeu sua decisão: explicou que os depoimentos entregues com o material probatório mostraram que "o jornalista simulou uma transação comercial para dar aparência legal a uma quantia de 300.000 quetzales (US$ 38 mil dólares), cuja origem não foi determinada." Assim, o tribunal multou o comunicador pelo mesmo valor.

Preso depois de reportagens

A determinação veio após 40 dias de debate oral público na sala de audiências do órgão judicial. O local estava lotado de jornalistas e defensores dos direitos humanos.

José Rubén Zamora, fundador do jornal investigativo El Periódico, publicou reportagens nas quais denunciou supostos casos de corrupção e suborno do presidente Giammattei. O conteúdo foi publicado antes de 26 de julho de 2022, quando foi detido.

O jornal era conhecido pela independência e por publicar investigações e reportagens sobre suposta corrupção no governo do atual presidente e de seus antecessores. Em 30 de novembro, El Periódico assegurou que “foi forçado” a parar de publicar sua edição impressa devido a dificuldades financeiras. Alguns meses depois, em 15 de maio deste ano, o jornal encerrou completamente suas operações.

O Ministério Público argumentou que a questão financeira e a falta de liquidez do jornal serviram de cenário para a suposta lavagem de dinheiro do jornalista. O tribunal explicou que Zamora teria entregado os US$ 38 mil ao ex-banqueiro Ronald García Navarijio para que lhe passasse um cheque no valor e assim pudesse adicioná-lo a uma conta no El Periódico, a fim de pagar os salários pendentes de seus funcionários.

Entidades denunciam restrições à imprensa

Em meio a um processo penal geral que durou pelo menos 10 meses, organizações internacionais, ativistas e entidades de direitos humanos exigiram dos responsáveis ​​que fizessem justiça neste caso. A Associação Interamericana de Imprensa (SIP) alertou que houve irregularidades no processo penal e, de acordo com o mais recente relatório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, publicado em 2022, na Guatemala há "uma deterioração das condições para o exercício do direito à liberdade de expressão".

A agência documentou um aumento na intimidação e assédio contra jornalistas, bem como ataques contra a integridade física dos profissionais, bem como difamação.

No mês passado, a Associação de Jornalistas da Guatemala informou que pelo menos 20 jornalistas foram forçados a fugir do país nos últimos anos e, após a decisão de quarta-feira, o Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ), com sede em Nova York, condenou o processo judicial contra Zamora.

“A sentença é vergonhosa e faz parte das tentativas do governo Giammattei de criminalizar o jornalismo. Isso definitivamente corrói a liberdade de imprensa na Guatemala”, argumentou Carlos Martínez de la Serna, diretor de programa do CPJ.

"As autoridades guatemaltecas devem acabar com a absurda farsa do processo penal contra ele. É hora de libertar José Rubén Zamora, porque seu único 'crime' foi o intrépido exercício de sua profissão", acrescentou.

Em maio, nove organizações internacionais de defesa da liberdade de imprensa e dos direitos humanos realizaram uma missão de observação na Guatemala para conversar com jornalistas e conhecer, em primeira mão, a situação de sua segurança devido ao trabalho que realizam.

De acordo com o relatório publicado pela Repórteres Sem Fronteiras (RSF), a conclusão da missão é que não só os meios de comunicação e aqueles que trabalham para eles estão sendo violados, mas também "os cidadãos que devem ser informados para tomar decisões de forma livre e consciente”.

"Na Guatemala, se intensifica um sistema de intimidação, silenciamento e restrições ao livre exercício do jornalismo. Em um contexto em que apenas 16% da população, segundo uma pesquisa recente do Prensa Libre, confia no Tribunal Supremo Eleitoral como instituição que garante um processo eleitoral democrático, tais restrições à imprensa podem afetar ainda mais a credibilidade do resultado da votação”, disse o documento.

No relatório, as organizações afirmam que "a criminalização de José Rubén Zamora e outros jornalistas do El Periódico "são apenas um exemplo do sistema que qualificaram de “repressivo" e que constantemente envia mensagens intimidantes à imprensa em geral.

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