A Líbia, no norte da África, há 12 dias sofre a ofensiva das milícias do general Khalifa Haftar para conquistar a capital, Trípoli. O país vive um conflito que já registrou cerca de 150 mortos e mais de 600 feridos. Segundo as Nações Unidas, cerca de 18 mil pessoas tiveram que ser deslocadas devido os combates.
Gina Marques, correspondente da RFI em Roma,
O primeiro-ministro da Líbia, Fayez al Sarraj, alertou nesta segunda-feira (15) que 800 mil migrantes estão prontos a "invadir" a Itália e a Europa por causa dos conflitos no país africano.
A Itália tem ligações históricas com a Líbia, não apenas pela proximidade geográfica, com uma distância no mar Mediterrâneo de menos de 400 km. A Líbia foi colônia italiana de 1911 à 1943.
Em 2008, o então premiê italiano Silvio Berlusconi pediu publicamente desculpas ao líder líbio Muammar Gaddafi pela ocupação colonial italiana e anunciou que a Itália indenizaria a Líbia pagando cerca de €3,4 bilhões de euros em 20 anos, ou seja, € 170 milhões de euros anuais em investimentos e projetos.
Naquela ocasião, em Bengazi, os líderes assinaram um tratado de amizade, parceria e cooperação entre os dois países, mas depois do assassinato de Muammar Gaddafi, não se falou mais neste acordo.
Além disso, a Itália tem interesses diretos na Líbia com a exploração de petróleo feita pela companhia italiana ENI. Esta empresa está presente na Líbia desde 1959 e administra atualmente 5 grandes reservas de petróleo no deserto e duas off-shore, na frente de Trípoli.
Preocupações
A Itália está preocupada com o conflito na Líbia principalmente por três motivos: a possível chegada maciça de migrantes, o peso político italiano no cenário internacional e também porque tem interesses petrolíferos dentro da Líbia.
O primeiro-ministro italiano Giuseppe Conte está tentando mediar o conflito, propondo o diálogo com os países que apoiam cada uma das principais facções líbias. Mas o próprio governo italiano está dividido.
De um lado, o ministro do Interior e vice premiê Matteo Salvini, do partido de extrema-direita Liga, mantém a linha dura de fechar os portos italianos para a chegada de migrantes. Do outro, o ministro do Desenvolvimento Econômico e também vice-premiê Luigi di Maio junto com a ministra da Defesa Elisabetta Trenta, ambos do Movimento Cinco Estrelas, força antissistema.
Segundo Di Maio e Trenta, não basta fechar os portos, é preciso uma solução mais estruturada e convencer os países europeus governados pela extrema-direita a receber migrantes.
A Líbia é dividida entre diversas facções, cujas principais são duas: do lado oeste o Governo de União Nacional, liderado pelo Fayez al Sarraj, que conta com grupos armados de Trípoli e Misurata, e é internacionalmente apoiado pela ONU, Turquia, Catar e pela Itália.
Do outro, o Parlamento de Tobruk, no leste do país e fiel ao general Khalifa Haftar, que lidera o Exército Nacional Líbio, principal força armada desta nação africana. Haftar conta com o apoio do Egito, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Rússia e França.
A Itália apoia Al Sarraj e o Governo de União Nacional em Trípoli. É importante ressaltar que o Banco Central da Líbia em Trípoli, sob comando de Al Sarraj, controla as exportações do petróleo líbio. Enquanto o general Haftar controla os poços do sul e os terminais do leste, mas não pode exportar diretamente o petróleo bruto por causa do embargo internacional. Este é um dos principais motivos desta guerra.
Chegada de refugiados
Além de interesses petrolíferos, a Itália quer bloquear a chegada de refugiados. Lembramos que para impedir a viagem de migrantes para a Europa, e principalmente para a Itália, em 2017 foi assinado um acordo entre o governo italiano, que na época era de centro-esquerda, e o Governo de União Nacional Líbio, liderado por Fayez al Sarraj.
O acordo prevê um financiamento para infraestrutura e assistência técnica para a guarda de fronteira da Líbia. Na ocasião, o premiê líbio, Al Sarraj apresentou uma lista para a Itália, pedindo navios, helicópteros, barcos de borracha, automóveis, telefones, e vários materiais que equivaliam a € 800 milhões. Em troca, a Líbia impediria a partida de migrantes.
Este acordo foi criticado por várias instituições internacionais, entre elas o Escritório do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) e a Anistia International porque os migrantes na Líbia vivem em prisões e são torturados.
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