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Reportagem

Ascensão de mulheres ao poder esbarra na discriminação, diz ministra do TST

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Filha de um agricultor e uma dona de casa, pobre, do interior, mulher – as condições estavam reunidas para que Delaíde Miranda Arantes tivesse projetos modestos de vida, mas uma causa social a levou a um dos mais altos cargos da Justiça brasileira. Ex-empregada doméstica para custear os estudos de Direito, ela é uma das cinco mulheres que comandam o Tribunal Superior do Trabalho, de um total de 27 ministros. A ascensão, entretanto, está longe do fim: depois de protagonizar uma conquista histórica para as domésticas – a PEC72, que regulamenta a profissão -, Delaíde luta para acabar com a discriminação das mulheres no mercado de trabalho.

Ministra Delaíde Arantes participou de palestra com advogado Marthius Sávio Cavalcanti Lobato e pesquisador francês Stéphane Monclaire.
Ministra Delaíde Arantes participou de palestra com advogado Marthius Sávio Cavalcanti Lobato e pesquisador francês Stéphane Monclaire. RFI
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Às vésperas do Dia Internacional da Mulher, comemorado neste sábado, Delaíde argumenta que o objetivo começa por equilibrar os salários entre os sexos no exercício das mesmas funções. “A OIT estabeleceu a igualdade de salários em 1951, e até hoje ainda não conquistamos esse direito. Estamos a caminho. Desistir, nunca”, afirmou, em entrevista à RFI, pouco antes de dar uma palestra promovida pelo Instituto das Américas, na Maison de l’Amérique Latine, em Paris.

O desafio maior, no entanto, é abrir os caminhos para ascensão feminina a cargos de liderança e poder, um campo no qual a presença masculina impera. A ministra lembra que a maioria das vagas nos concursos públicos é conquistada por mulheres – porém os cargos de poder nas mesmas instituições estão nas mãos de homens. “Ou seja, quando a mulher depende da competência e do esforço dela, ela ingressa mais do que o homem. Mas quando ela depende da sociedade, do que está estabelecido cultural e socialmente, a carreira dela bloqueia”, constata.

Segundo Delaíde, apenas 16% das funções de poder no serviço público são exercidas por mulheres no Brasil - situação que ela vivencia no próprio TST. Suas colegas do Supremo Tribunal Federal sentem ainda mais o problema: são duas ministras mulheres para 11 ministros homens. “O mais difícil é que é uma coisa meio subliminar, meio velada. Se você me perguntar ‘você é discriminada no seu trabalho?’, eu direi que sou. Mas eu não tenho como citar um exemplo de preconceito e de discriminação, porque é muito sutil”, relata a goiana de Pontalina, a 120 quilômetros da capital estadual. “Portanto, eu tenho que trabalhar contra isso sem ter um elemento concreto para denunciar.”

Sociedade sexista e eleição de Dilma

A ministra disse concordar com a presidente Dilma Rousseff, que em dezembro afirmou que “a sociedade brasileira ainda é sexista e preconceituosa”. “Sim, ainda é. Mas eu acredito que estamos no caminho para mudar essa posição”, avalia. A eleição da petista à presidência, destaca, é um sinal positivo de evolução da sociedade nas questões de gênero. “O Brasil elegeu uma mulher para a presidência. Uma mulher em quem nós, mulheres, podemos nos espelhar, tanto sob o ponto de vista da sua história quanto do seu trabalho. Isso é um precedente dos mais importantes.”

Delaíde ressalta que mesmo as mulheres que chegam ao topo do poder enfrentam cotidianamente manifestações de machismo. Ela relembra o caso da deputada federal Manuela D’Ávila (PC do B), que em dezembro foi alvo de comentários sobre a sua vida pessoal por parte do colega Duarte Nogueira (PSDB), em plena sessão na Câmara. “Estado civil, aparência... Nós assistimos recentemente a uma deputada federal sendo atacada por um parlamentar homem, fazendo referências a um namoro dela com um ministro, algo que é totalmente da vida pessoal dela. Isso são coisas que nós, mulheres, não podemos admitir.”

Palestra na França

Em sua palestra em Paris, ao lado do advogado Marthius Sávio Cavalcanti Lobato e mediada pelo pesquisador francês Stéphane Monclaire, Delaíde falou sobre os desafios do Brasil para melhorar a justiça social. Ela destacou a importância de se fazer cumprir a Constituição nas questões trabalhistas, do fim do trabalho infantil e em condições análogas à escravidão, e de uma melhor administração do imenso volume de processos trabalhistas no país. Também não deixou de fora a preocupação com a segurança do trabalho: a cada dia, morrem em média sete trabalhadores em acidentes durante o expediente no Brasil.
 

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