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Planeta Verde

Capital da moda, Paris abre hub de produção de vestuário sustentável

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Paris é conhecida como a capital da moda, mas apenas 5% das roupas vendidas na França são produzidas no país. A chegada das marcas de fast fashion, fabricadas na Ásia, dizimou a indústria têxtil nacional e, de quebra, contribuiu para a aceleração de um processo que transformou a moda em uma das atividades mais poluentes do planeta.

Fashion Green Hub em Paris foi inaugurado oficialmente no começo de outubro.
Fashion Green Hub em Paris foi inaugurado oficialmente no começo de outubro. © Lúcia Müzell/ RFI
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Desde os anos 1990, a cadeia de fabricação se tornou cada vez mais sintética – baseada em matérias-primas derivadas do petróleo – e abundante em produtos químicos tóxicos para o meio ambiente. Além disso, ao derrubar os preços nas lojas, estimulou um padrão de consumo desenfreado, que depende de uma rede global de transportes, com impacto nas emissões de gases de efeito estufa.

É nesse contexto que um espaço para iniciativas por uma moda mais sustentável abriu as portas no 13º distrito da capital francesa, o Fashion Green Hub Grand Paris. “Paris, capital da moda, capital do luxo. Nós trouxemos a nossa iniciativa pela mudança a todo o setor: do luxo até o pequeno artesão, passando pela indústria, pelos operários envolvidos na cadeia da criação têxtil – e este talvez seja o combate mais importante. Em Paris, temos uma grande visibilidade: poderemos dar ideias para outras regiões do mundo”, disse o diretor-geral, Lucas Thivolet Conde Salazar.  

A agência francesa da Transição Ecológica (Ademe) afirma que 100 bilhões de toneladas de roupas são vendidas por ano no mundo, para vestir uma população de 8 bilhões de indivíduos. Uma pessoa hoje compra, em média, 40% mais peças do que fazia há 15 anos, e utiliza o vestuário pela metade do tempo que costumava usar. O impacto ambiental do setor têxtil chega a ser maior do que o dos transportes aéreo e marítimo juntos, alerta a respeitada agência.

'Materioteca' propõe diferentes tipos de tecidos disponíveis nos estoques de marcas parceiras espalhadas pela França.
'Materioteca' propõe diferentes tipos de tecidos disponíveis nos estoques de marcas parceiras espalhadas pela França. © Lúcia Müzell/ RFI

Concorrência asiática

A regra número 1 para combater esse problema é comprar menos e melhor. Um dos objetivos do Fashion Green Hub é reaproveitar as toneladas de tecidos não aproveitados nas fábricas e reciclar as peças consideradas fora de moda.

“Queremos contribuir para a indústria se preparar para a restauração e a transformação. Quando visitamos uma usina hoje, ela não quer fazer isso porque a cadeia de valor não compensa o esforço de desmontar uma roupa. Não é rentável”, explica Thivolet.

Lucas Thivolet Conde Salazar é diretor-geral do Fashion Green Hub Grand Paris. "Queremos contribuir para a indústria se preparar para a restauração e a transformação", indica.
Lucas Thivolet Conde Salazar é diretor-geral do Fashion Green Hub Grand Paris. "Queremos contribuir para a indústria se preparar para a restauração e a transformação", indica. © Lúcia Müzell/ RFI

O hub surgiu em Roubaix, antigo polo da indústria têxtil francesa que quase foi à falência após a emergência do prêt-à-porter de baixo custo made in China. Para o diretor-geral do hub, as marcas francesas não terão futuro se continuarem tentando concorrer com os asiáticos – a solução, para ele, passa por revalorizar a cadeia nacional graças a uma produção menos poluente.

A transformação inclui voltar a priorizar materiais naturais e a fabricação de tecidos com um uso mínimo de água, agrotóxicos e processos químicos. A tecnologia é outra aliada crucial neste combate: as máquinas mais modernas permitem limitar o desperdício de matérias-primas.  

Após um ano de implementação na capital, com apoio da prefeitura, a iniciativa passou de 400 para 530 parceiros, entre eles nomes nacionais de peso como Petit Bateau, Agnès B. e Jules.

O espaço também reúne start ups e jovens estilistas determinados a iniciar a carreira com peças sustentáveis. É o caso da iraniana Azine, que começa a tirar do papel a sua primeira coleção, inspirada na resistência da mulher iraniana.

Estilista iraniana Azine finaliza a primeira coleção graças à estrutura do Fashion Green Hub em Paris.
Estilista iraniana Azine finaliza a primeira coleção graças à estrutura do Fashion Green Hub em Paris. © Lúcia Müzell/ RFI

“Existem tecidos transparentes que representam uma forma de liberdade, para mim. Eu quis mostrar tudo que, para mim, dá poder às mulheres e mostra o que acontece no Irã”, revela a asilada política em Paris há sete anos. “Aqui, encontro mesa para cortar, máquinas, tudo que preciso. Uso roupas de segunda mão e estoques não utilizados de uma grande maison.”

Legislação mais rigorosa

Lucas Thivolet ressalta que o Fashion Green Hub está particularmente atento ao o greenwashing – estratégia de marketing em que as empresas promovem mudanças de fachada apenas para parecerem mais sustentáveis.

“Com certeza há uma distância entre as palavras e os atos, os resultados. Entre as empresas que estão muito envolvidas, algumas estão atrasadas. Querem entrar na nossa rede, mas ainda não se transformaram”, nota o diretor-geral. “Temos visto muitas marcas médias francesas fecharem e uma das principais razões é que o setor deve se reinventar e rápido, porque o desafio é imenso e a transição está em curso. Se ele não mudar a sua forma de produzir e o seu paradigma econômico, muitas vão desaparecer, e muito mais rápido do que pensam.”

Ateliês também recebem trabalhadores em reinserção profissional, orientados por profissionais com experiência na alta costura francesa.
Ateliês também recebem trabalhadores em reinserção profissional, orientados por profissionais com experiência na alta costura francesa. © Lúcia Müzell/ RFI

Nesse sentido, as mudanças na legislação francesa têm sido pioneiras para obrigar as empresas a evoluírem. Desde 2018, por exemplo, elas são proibidas de jogar fora restos de tecidos ou estoques não utilizados. O pacote da Lei Contra o Desperdício, que entrou em vigor este ano, inclui maior transparência sobre informações como onde a peça foi fabricada, com que materiais e como pode ser reciclada. 

Na União Europeia, uma nova lei vai passar a obrigar dos países-membros, a partir de janeiro de 2025, a separação dos têxteis na coleta de lixo, com vistas à reciclagem. Lucas Thivolet espera, ainda, que as incitações também venham pelo bolso, com uma alta do imposto de importação para produtos têxteis e incentivos fiscais para quem produzir com menor impacto ambiental.

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