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Radar econômico

Venda do Grupo Pão de Açúcar pelo Casino francês anima compradores no Brasil e no mundo

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Enquanto o futuro do poderoso Grupo Casino está em jogo na França, no Brasil a expectativa é para onde vai o Grupo Pão de Açúcar (GPA), tirado das mãos do empresário Abílio Diniz há 11 anos, quando foi adquirido pela gigante francesa do varejo. A negociação mobiliza potenciais compradores no Brasil e no exterior, incluindo concorrentes e o próprio Diniz.

Afundado em dívidas, grupo francês Casino vai se desfazer da rede de supermercados Pão de Açúcar no Brasil, comprada há 10 anos.
Afundado em dívidas, grupo francês Casino vai se desfazer da rede de supermercados Pão de Açúcar no Brasil, comprada há 10 anos. REUTERS/Eric Gaillard
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Lúcia Müzell, da RFI

Afundado em dívidas, o Casino começou a se desfazer de ativos espalhados pelo mundo desde 2014, mas a crise gerada pela pandemia e em especial na América Latina só piorou o quadro, que o contexto inflacionário e de juros na Europa terminou de sepultar. No fim de junho, a companhia anunciou a intenção de vender as suas parcelas no GPA, do qual é acionista controlador, com 40,9% dos papéis. Em todo o Brasil, são quase mil lojas em jogo – é o segundo maior pilar do grupo francês no mundo.

Em março, a companhia já se desfez de 12% do seu capital da rede Assaí, com a qual levantou € 600 milhões para conseguir respirar até o fim do ano, em conjunto com medidas de emergência negociadas com os credores e o governo francês. Na América Latina, o Casino ainda tem forte presença na rede colombiana Éxito – que também será cedido, como parte do plano de reestruturação da gigante do varejo.

“Estamos todos empolgados com essa mudança. A gente tem visto todos os agentes envolvidos nessa cadeia de valor muito atentos e querendo no mínimo analisar a oportunidade – seja outras redes, fundos de investimentos ou de mercado de alimentação dentro do lar”, observa Eduardo Yamashita, COO da consultoria especializada em varejo Gouvêa Ecosystem. "Essa operação do Casino está menos conectada com a operação brasileira e mais com os negócios internacionais do grupo. É por isso que a gente tem visto essa quantidade de interessados no ativo GPA, que é realmente único.”

Revanche de Diniz?

Na época da venda do Grupo Pão de Açúcar, a família Diniz enfrentou uma longa batalha para evitar a aquisição pelo CEO e acionista majoritário do Casino, Jean-Charles Naouri – que acabou vencendo a disputa. Abílio levou anos para superar a perda do controle da rede varejista fundada pelo seu pai, Valentim, no fim dos anos 1940. Desde então, uniu-se à rival francesa Carrefour, da qual é vice-presidente do conselho de administração no Brasil e um dos principais acionistas no grupo global.

O mercado especula se teria chegado a hora da revanche do empresário brasileiro face a Naouri – pessoalmente ou via Carrefour.  "Essa história é icônica e o Abílio e a família falam abertamente sobre esse tema nos livros que já foram escritos. Foi um capítulo importantíssimo na história do varejo brasileiro”, destaca Yamashita.

Abílio Diniz perdeu o controle do Grupo Pão de Açúcar em 2013 e agora poderia reaver a empresa fundada por seu pai nos anos 1940.
Abílio Diniz perdeu o controle do Grupo Pão de Açúcar em 2013 e agora poderia reaver a empresa fundada por seu pai nos anos 1940. AFP - MIGUEL SCHINCARIOL

O analista salienta que "obviamente o Abílio e o seu family office são grandes candidatos” para retomar o GPA, assim como o Carrefour – mas estão longe de serem os únicos. "Fundos de investimentos nacionais e internacionais estão com um apetite muito grande. A negociação de um bloco tão relevante de um varejista com uma presença tão grande, principalmente no sudeste, que já consolidado e é o maior mercado do Brasil, com marcas próprias e os avanços tecnológicos que eles fizeram, são ativos que chamam muita atenção”, insiste.

Jean-Charles Naouri, um 'tubarão' devorado pela própria ganância

O empresário francês foi apelidado de “lobo”, “tubarão” ou “predador”, depois de consolidar o método de entrar aos poucos no capital de empresas familiares em apuros, mas sempre com opção de compra futura – que na maioria dos casos, se tornava fatal, como no Grupo Pão de Açúcar. Era o auge da expansão fulminante do Casino por mercados emergentes, sob o comando de Naouri.

“Toda a vez que entra um player como o Casino, relevante globalmente, o mercado brasileiro amadurece muito. Isso aconteceu em todos os episódios, de uma maneira geral, e não só no segmento alimentar”, relembra Yamashita. "Foi assim com a entrada do WalMart no Brasil – que depois saiu, mas isso faz com que o mercado no Brasil elevasse a barra. Hoje o varejo no Brasil tem o nível de sofisticação e desenvolvimento muito simular aos grandes mercados globais, como o norte-americano, europeu e até mesmo asiático”, constata.

A fama de Naouri de 'gênio das finanças’, porém, caiu por terra depois que os balanços do Casino se anunciavam cada vez mais deficitários – seriam € 6,5 bilhões em dívidas. No último fim de semana, os três bilionários reunidos na holding 3F – Xavier Niel, Matthieu Pigasse et Moez-Alexandre Zouari – decidiram não reapresentar a proposta de resgate do grupo porque “a situação financeira [do Casino] está mais deteriorada do que o previsto”, e num contexto em que as previsões de receitas não param de ser revistas para baixo.

A ironia do destino é que um estrangeiro, o tcheco Daniel Kretinsky – apoiado pelo francês Marc Ladreit de Lacharrière e o fundo de investimentos britânico Attestor – representa a única oferta sobre a mesa para salvar o Casino do buraco, com um aporte de € 1,2 bilhão. Kretinsky atualmente é o segundo maior acionista do Grupo Casino e já advertiu que, se o negócio for fechado até o fim do mês, como previsto, não haverá demissões na empresa – à exceção de Naouri.

O jornal Le Monde antecipa que o poderoso CEO "deve deixar o mundo do varejo como entrou: sozinho e sem fortuna, depois de protagonizar uma fábula darwinista em que devorou a todos até ser ele próprio devorado”. Nos próximos dias, ele deve deixar para trás um império com 200 mil funcionários no mundo, dos quais a maioria estão na América do Sul e um quarto na França, espalhados por supermercados como Monoprix, Franprix, Géant e Spar.

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