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Reportagem

Trans brasileira sofre ameaças do ex-namorado em Paris e teme sair de casa

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A maquiadora Pamela Ferreira, que mora na França há 12 anos, vive o que chama de “pesadelo” desde junho deste ano, após ser agredida e ameaçada pelo ex-namorado brasileiro.

Colagem em muro de Paris em que se pode ler "Nem perdão, nem esquecimento". Campanha feira por coletivo feminista luta contra a violência de gênero na França. 30 de Agosto de 2019.
Colagem em muro de Paris em que se pode ler "Nem perdão, nem esquecimento". Campanha feira por coletivo feminista luta contra a violência de gênero na França. 30 de Agosto de 2019. © AFP - CHRISTOPHE ARCHAMBAULT
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Reportagem de Camila Luz

A maquiadora mantinha um relacionamento à distância com Rafael desde 2017. No início de 2021, ele se mudou para a França para viver junto da companheira. “Após alguns meses vivendo junto comigo aqui em Paris eu acabei descobrindo as traições dele e foi aí que o pesadelo começou na minha vida”, conta Pamela.

A maquiadora diz que terminou o relacionamento no dia 18 de junho, e a reação do então companheiro foi violenta. “Ele ficou extremamente alterado, agressivo, me xingou, me ameaçou, eu chamei a polícia, mas quem é que liga para uma mulher negra, transgênero e que nem é deste país?”, disse.

Ela tentou registrar a denúncia em três delegacias diferentes, mas só conseguiu quando a associação Mulheres da Resistência prestou ajuda.

Apesar do boletim de ocorrência, a maquiadora conta que Rafael continuou a agredi-la virtualmente. Segundo ela, o brasileiro chegou a enviar diversas fotos íntimas da ex-namorada para contatos profissionais, além de criar perfis falsos em redes sociais e enviar mensagens ameaçando sua integridade física.

De acordo com a maquiadora, Rafael continua vivendo tranquilamente no país, onde está de maneira irregular, enquanto ela teme por sua vida.

“Eu vivo com medo, eu não estou no meu país, ainda tem o racismo, a transfobia. Eu estou me sentindo desprotegida, com receio de que ele possa realmente me matar”, disse a maquiadora.

Pamela Ferreira vive o que chama de “pesadelo” desde junho deste ano, após ser agredida e ameaçada pelo ex-namorado.
Pamela Ferreira vive o que chama de “pesadelo” desde junho deste ano, após ser agredida e ameaçada pelo ex-namorado. © Acervo pessoal

A maquiadora buscou ajuda da advogada brasileira Fayda Belo, especialista em crimes de gênero. A advogada apresentou um pedido de medida protetiva para o ministério brasileiro de Relações Exteriores. Como Brasil e França têm uma relação diplomática e acordos de cooperação jurídica internacional, Pamela tem a esperança de que seu país cobre da justiça francesa soluções jurídicas para manter a sua segurança.

“Hoje ela está presa, trancada em casa, com medo de morrer. Enquanto o agressor continua solto, praticando crimes contra ela, ainda que de maneira virtual. É preciso que a justiça francesa dê a Pamela o direito de ficar viva”, disse Belo.

França não considera violência contra mulher como crime

Em solo francês, a maquiadora também recebeu ajuda do núcleo parisiense do Grupo Mulheres do Brasil, que funciona como uma rede de apoio para brasileiras no mundo todo. Casos como o da maquiadora são atendidos pelo Comitê de Combate à Violência contra a Mulher, comandado pelas advogadas Ana Perivolaris e Marcella Galozzi.

Perivolaris explica que o Mulheres do Brasil trabalha com associações francesas que ajudam a entender o ecossistema jurídico francês. Uma diferença importante é que no Brasil, a violência contra a mulher é crime, enquanto na França é um delito médio. Ela também chama atenção para a dificuldade em denunciar casos de violência de gênero nas delegacias de polícia.

“A dificuldade da mulher em denunciar é porque existe ainda um despreparo muito grande, não só das delegacias de polícia. Existe um desconhecimento a nível estrutural da sociedade em compreender que é uma questão complexa, uma questão multidisciplinar, uma questão que entra na esfera íntima das pessoa”, disse.

O grupo também oferece apoio psicológico, considerado fundamental nessas situações.

Acolhimento em momento de violência

Segundo Perivolaris, a mulher que chega à delegacia para denunciar a violência conjugal deve ser recebida com empatia e acolhimento. Nesse sentido, ela reforça o papel das associações e da sociedade civil.

“Normalmente, a mulher chega [ao Comitê de Combate à Violência contra a Mulher] em um estado bastante confuso, com muita informação, com muito medo, com muitas dúvidas”, disse. As advogadas, então, explicam todo o passo a passo que a vítima deve percorrer para ficar em segurança.

De acordo com a advogada, em casos como o de Pamela, além de ser difícil reunir a energia para denunciar, a mulher se depara com obstáculos para de fato conseguir romper o ciclo de violência. “A porta de saída seria a entrada na delegacia de polícia, e essa entrada é muito difícil, na verdade ela se vê diante de um muro”, finaliza Perivolaris.

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