Acessar o conteúdo principal
RFI Convida

"Busco mostrar a resistência de comunidades ao colonialismo", diz fotógrafo Francisco Proner

Publicado em:

Aos 23 anos, o fotógrafo brasileiro Francisco Proner é considerado um dos profissionais mais promissores da jovem geração de fotojornalistas, na avaliação dos organizadores do 35° Festival Internacional Visa pour l’Image, realizado atualmente em Perpignan, no sul da França. Entre visitas a exposições e compromissos profissionais, Proner falou sobre seu trabalho de documentação de conflitos sociais na América Latina.

O fotógrafo brasileiro Francisco Proner, em Perpignan.
O fotógrafo brasileiro Francisco Proner, em Perpignan. © EDUARDO MANFRÉ
Publicidade

Adriana Moysés, enviada especial da RFI a Perpignan

Curioso, talentoso e precoce, esta é quinta vez que Francisco Proner acompanha presencialmente o Festival Visa pour l'Image. O paranaense, residente no Rio de Janeiro, começou muito cedo na fotografia, aos 14 anos, ainda na adolescência.

“Eu já tinha interesse em ser fotógrafo e começava a fazer trabalhos amadores sobre temas sociais”, conta. Ele descobriu o festival francês – maior evento mundial de fotojornalismo – por meio de um amigo, "um fotógrafo da velha guarda da fotografia". “Ele ainda tinha os crachás das vezes que veio a Perpignan e me falou que se eu quisesse começar nesse mundo, tinha de vir nesse festival”, recorda o brasileiro.

Esta oportunidade surgiu em uma viagem à Europa quando Proner tinha 16 anos. “Sem conhecer ninguém, fiquei vendo as exposições, indo às projeções todas as noites e acabei conhecendo muita gente que me ajudou bastante”, destaca.

Esta primeira imersão deu a ele a dimensão da indústria da fotojornalismo. Desde o segundo dia, Proner entendeu que tinha de separar as melhores fotos para mostrar e começou a fazer fila às 7h da manhã, como vários outros fotógrafos muito mais velhos do que ele, para poder conseguir reservar um espaço para conversar com editores de agências e da imprensa.

Investigação sobre o bolsonarismo

Para esta edição, Proner teve uma série de reportagens sobre a campanha presidencial de 2022 no Brasil inaugurando as chamadas “Noites de projeção” do festival. Durante seis dias, a partir de 21h30, espectadores e profissionais se reúnem no Campo Santo, um antigo cemitério medieval de Perpignan, para assistir, ao ar livre, a reportagens fotográficas projetadas num telão sobre os mais variados temas que marcaram a atualidade no último ano, em todas as regiões do mundo. Em 2018 e 2022, o brasileiro também teve trabalhos exibidos neste evento da programação.

“É engraçado, porque a primeira vez que eu vim ao festival, quando tinha 16 anos, eu olhava para essas projeções maravilhado. A gente vê muito esse tipo de espaço dedicado à música, a shows, ao cinema. Mas ver um auditório desse tamanho, a céu aberto, passar 1h30 só vendo fotografia, é uma coisa muito única desse festival”, diz ele.

Proner ficou satisfeito com a boa receptividade do público francês à sua cobertura das campanhas de Lula e de Jair Bolsonaro no ano passado. Ele trabalhou para vários meios de comunicação, entre eles para o jornal Le Monde.

“Em quatro anos de governo, eu nunca tinha tirado uma foto do Bolsonaro. Já tinha fotografado os apoiadores, (...) manifestações em que ele iria, mas não foi. Mas foi só no ano passado que finalmente fotografei o ex-presidente. E foi uma experiência diferente, porque eu me acostumei durante a minha carreira a fotografar protestos, geralmente de esquerda, de movimentos sociais, de servidores públicos”, explica.

Influência religiosa

Essa cobertura levou Proner a viajar pelos “interiores” do Brasil. “Tentando entender um pouco mais do bolsonarismo, ficam claros os motivos pelos quais as pessoas acabam votando no Bolsonaro”, afirma. “O Brasil é um país que é muito cristão, muito religioso, muito retrógrado em vários sentidos, mas principalmente nos interiores, que é onde a religião tem mais abrangência e onde o Estado tem menos presença”, observa.  

Proner considera o momento atual, no qual Bolsonaro, os generais que o apoiaram e o tenente-coronel Mauro Cid – figuras que ele fotografou – enfrentam investigações da Polícia Federal, do Supremo e do Congresso Nacional, algo "da maior importância para o futuro do país".

“A gente vive um momento em que é muito importante falar sobre Bolsonaro, falar sobre o bolsonarismo, justamente porque isso está muito próximo de ter um final trágico para eles”, analisa.

As imagens de Proner sobre esse governo de extrema direita já fazem parte dos arquivos históricos da política brasileira.

Resistência de comunidades latino-americanas

Há algum tempo, Proner trabalha em um projeto autoral de longo prazo, no qual investiga como comunidades tradicionais resistem às diversas ameaças na América Latina. Ele começou pela Bolívia, depois viajou para Equador, Peru, México, Argentina e, agora, documenta conflitos no Brasil.

No México, o brasileiro fotografou grupos de autodefesa que se constituíram entre indígenas para se proteger da violência do narcotráfico, ante o abandono do Estado mexicano. Imagens desta etapa foram exibidas no festival de Perpignan em 2022.

Já no Equador, ele documentou o impacto da exploração de petróleo por companhias europeias, estadunidenses e também chinesas nas comunidades tradicionais indígenas da Amazônia equatoriana. Essa atividade contamina a terra e a água consumida pelos indígenas, que resistem a ela.

“Eu fui começando o projeto e selecionando pequenas histórias, pequenas fábulas da América Latina para contar um pouco desse processo que acontece simultaneamente em todos os países da região”, afirma.

Recentemente, Proner fez um trabalho sobre o Movimento Sem Terra no Brasil que será exposto em outubro no Canadá. As imagens mostram a resistência dos camponeses brasileiros diante das ameaças.

Questionado se observa algum impacto político de sua fotografia, Proner diz que seu principal foco de interesse são os conflitos sociais em países da América Latina.

“Eu sempre busco trazer essa visão um pouco menos colonial para os temas que tocam o continente latino-americano e entender o ponto de vista das pessoas que estão sofrendo com o colonialismo e com o neocolonialismo”, destaca.

Por isso, as imagens de colegas latino-americanos e de não europeus exibidas no Festival Visa pour l’Image sempre despertam o interesse do brasileiro. “Eles são poucos, mas têm trabalhos muito relevantes”, ressalta. Proner elogia os esforços de europeus que documentam os países da região transmitindo uma visão positiva sobre a soberania dos povos da América Latina.

NewsletterReceba a newsletter diária RFI: noticiários, reportagens, entrevistas, análises, perfis, emissões, programas.

Acompanhe todas as notícias internacionais baixando o aplicativo da RFI

Veja outros episódios
Página não encontrada

O conteúdo ao qual você tenta acessar não existe ou não está mais disponível.