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Roraima/Xenofobia

"Foi planejado", diz pároco de Pacaraima sobre atos de xenofobia de brasileiros em Roraima

"Forças políticas tenebrosas exacerbam com discursos de ódio as tensões migratórias no Brasil, antes das complicadas eleições de 2018", afirma Jesús López de Bobadilla, pároco da localidade fronteiriça de Pacaraima onde, no sábado (18), ocorreram violentos ataques de brasileiros contra refugiados venezuelanos.

Jesús López de Bobadilla, pároco da localidade fronteiriça de Pacaraima, em Roraima.
Jesús López de Bobadilla, pároco da localidade fronteiriça de Pacaraima, em Roraima. Mauro Pimentel / AFP
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"O Brasil está em uma situação política, econômica e social muito delicada, às vésperas de eleições, e tudo é aproveitado", analisou o religioso espanhol, de 77 anos, que está há nove em Pacaraima.

Mais de 1.000 venezuelanos que acampavam nesta pequena cidade do estado de Roraima foram expulsos no sábado por grupos de moradores que atearam fogo em suas barracas e roupas, além de perseguí-los com paus e facas aos gritos de "Fora!", de acordo com relatos de várias testemunhas à agência AFP.

"O episódio desses dias foi planejado, não foi uma ação espontânea. Não tenho a menor dúvida. Existem forças políticas tenebrosas que se empenham em passar por cima das dificuldades do povo e aproveitar a xenofobia, que a cada dia é mais forte, como elemento válido para as eleições", disse, sem querer dar nomes, Bobadilla, que de segunda a sexta-feira oferece café da manhã a centenas de migrantes na modesta paróquia local.

"Precisam pedir aos políticos responsáveis que, por favor, parem. Tudo isso está muito manipulado. São muito irresponsáveis com seus discursos inflamados de ódio", advertiu. O Brasil celebrará em outubro eleições gerais. O favorito à Presidência no primeiro turno, na ausência do ex-presidente Lula, é Jair Bolsonaro (PSL), de extrema direita. Em Roraima, Bolsonaro inclusive superaria Lula, de acordo com uma pesquisa do Ibope divulgada esta semana.

A governadora de Roraima, Suely Campos, que tenta a reeleição, pediu em várias ocasiões o fechamento provisório da fronteira à entrada de venezuelanos, alegando que o estado não conta com recursos suficientes para atender tamanho fluxo de migrantes. Campos, do Partido Progressista (PP), repudiou os incidentes e ordenou reforçar os efetivos de segurança, informou a sua assessoria.

Medo de represálias

"É vergonhoso que Pacaraima tenha escrito essa página terrível em sua história", lamenta Bobadilla, ao se referir aos incidentes de sábado.O religioso não tem muita esperança de que a situação melhore, mas acredita que para que alguma coisa mude é preciso um controle mais criterioso na fronteira, a fim de evitar a entrada de venezuelanos com perfil criminoso. Também recomenda aumentar a presença policial e atender os brasileiros em situação de pobreza, para que os habitantes não se sintam em "desvantagem" frente os imigrantes.

"Somos pessoas de paz", afirmou um venezuelano que foi tomar café da manhã e diz viver em Pacaraima há um ano. Não quer se identificar por medo de represálias. Depois dos ataques, já não se sente seguro e cruza diariamente a fronteira para dormir em um abrigo improvisado do lado venezuelano. Assegurou que os venezuelanos enfrentam uma "perseguição" por parte de alguns membros da comunidade, inclusive de certos policiais brasileiros.

Contrariando suas expectativas, o salão da paróquia recebeu nesta terça-feira cerca de 1.000 pessoas em busca de uma porção de pão e uma xícara de café com leite. Normalmente a paróquia atendia entre 1.500 e 2.000 imigrantes por dia. Depois das expulsões, o número caiu pela metade, mas essa assistência para estar se recuperando.

"A fome venceu o medo", declarou Bobadilla com certo alívio.

(Com informações da AFP)

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