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“Ávido por notoriedade, Bolsonaro sempre foi consciente do capital político de suas provocações”, afirma Le Monde

O jornal francês Le Monde que chegou às bancas nesta segunda-feira (29) trouxe em sua capa a vitória de Jair Bolsonaro no Brasil, além de dedicar três páginas inteiras ao resultado da eleição presidencial no país. “O ex-militar, nostálgico da ditadura, misógino e racista ganhou com vantagem de Haddad”, diz o diário.

Manchete do jornal Le Monde desta segunda-feira é a eleição de Jair Bolsonaro.
Manchete do jornal Le Monde desta segunda-feira é a eleição de Jair Bolsonaro. Reprodução
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A reportagem da jornalista Claire Gatinois traça o histórico de Bolsonaro, desde seu nascimento em 1955 em São Paulo, passando por sua carreira militar e parlamentar, até sua chegada à Presidência do Brasil no domingo (28).

“Ele não é mais esse parlamentar desprezado por seus colegas, conhecido por sua atitude e sua vulgaridade. Assumindo a estatura de um chefe de Estado, ele anunciou seu triunfo numa sessão de Facebook live, se passando pelo salvador de um Brasil que ele diz proteger da ameaça ‘comunista’ e da ‘perversão’ do mundo moderno”, diz o texto.

De acordo com a análise de Claire Gatinois, vários ingredientes permitiram a ascensão de Bolsonaro no Brasil: as críticas ao PT, o discurso moralista e punitivo e o perfil “antissistema”. “Jair Bolsonaro é bruto, seco. Ele fala palavrão e é agressivo. Ele representa o brasileiro médio que, como ele, se indigna com a situação do país”, afirma Adriano Gianturco, professor de ciência política do Ibmec, entrevistado pela jornalista.

Já Antonio Augusto de Queiroz, diretor do departamento intersindical de assistência parlamentar, explica que Bolsonaro é um “personagem truculento, impulsivo, mas inativo”. “Ele age na negação, apontando problemas sem propor soluções. Ele se contenta de designar culpados que devem ser punidos”, diz.

Pablo Ortellado, professor da Universidade de São Paulo (USP), lembra que, no mundo todo, os candidatos de extrema direita fazem concessões para aumentar o eleitorado. No caso de Bolsonaro, que não precisou fazer nenhuma, foram os eleitores que se adaptaram e aceitaram seu discurso, tal como era.

Para a repórter, a grande sacada de Bolsonaro foi ter se dado conta de que sua atitude e sua agressividade tinham bastante capital político no seio da sociedade brasileira. “Ávido de notoriedade, ele convocava jornalistas para assistir a suas polêmicas programadas”, continua Claire Gatinois. A jornalista lembra o episódio em que Bolsonaro disse à deputada Maria do Rosario (PT) que ela “não merecia ser estuprada”. E também faz menção à votação do impeachment de Dilma Roussef, quando Bolsonaro dedicou sua escolha ao coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, um dos maiores torturadores da ditadura militar brasileira.

“Jair Bolsonaro odeia o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o PT, Cuba, Venezuela, Nicolas Maduro, Hugo Chavez, o MST e tudo o que lembra, de perto ou de longe, os ‘vermelhos’. Prometendo fuzilar os ‘petralhas’, ele fez uma campanha cheia de desprezo pelos índios, negros, mulheres e homossexuais. Ele trata os jornalistas de imbecis, as mulheres de idiotas e elogia os ‘cidadãos de bem’, a quem promete entregar armas e munição”, conclui a repórter.

Vitória garantida, mas programa vago

A jornalista do Le Monde lembra que, no entanto, se a vitória de Bolsonaro foi avassaladora contra o candidato do PT, Fernando Haddad, será preciso deixar para trás suas táticas de campanha – que funcionaram até agora – e apresentar um projeto de verdade. “O ódio não é um programa de governo. E Jair Bolsonaro, ausente dos debates desde seu ferimento no abdômen, deve agora explicar como o ódio ao socialismo e as armas de fogo vão reconstruir um país à beira do abismo”.

Claire Gatinois ressalta que o programa econômico de Paulo Guedes, conselheiro de Bolsonaro, é extremamente impopular. Além disso, será preciso enfrentar a resistência do resto da população, composta em sua maioria por mulheres negras e por pessoas que condenam as ações antidemocráticas, que acham que homossexuais devem ser aceitos e que são contra o porte de armas.

Oposição em frangalhos

Em frangalhos: é assim que Le Monde descreve o PT pós-Bolsonaro. “No poder de 2003 a 2016, o PT se tornou a oposição. Uma oposição assassinada pelas declarações de Bolsonaro, que soube usar a raiva da população contra o partido de esquerda. Uma oposição enfraquecida, também, por seus próprios erros”, diz a reportagem.

Para o jornal, “pouco importa que o PT não seja o partido mais implicado em casos de corrupção”. “O eleitor brasileiro preferiu eleger um militar autoritário, racista, homofóbico e misógino do que imaginar o PT de novo no poder: vale tudo no lugar da ‘roubalheira’ do PT”.

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