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"Congresso muito fragmentado será obstáculo para governo Bolsonaro", diz professor da UERJ

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Neste dia 1° de janeiro, Jair Bolsonaro assume a presidência do Brasil. Com ele, abre-se um novo capítulo da história política do país. O novo chefe de Estado pretende impor com rapidez seu estilo de governar e iniciar as reformas previstas em seu programa, particularmente na área econômica. Mas o governo Bolsonaro já arranca com imensos desafios pela frente na opinião de Maurício Santoro, professor de Ciências Políticas e Relações Internacionais da UERJ, Universidade Estadual do Rio de Janeiro.

Maurício Santoro, professor de Relações Internacionais da UERJ.
Maurício Santoro, professor de Relações Internacionais da UERJ. Foto: Arquivo Pessoal
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Entre eles, a necessidade de harmonizar o trabalho de uma equipe formada por muitas personalidades inexperientes no terreno político e, ao mesmo tempo, estabelecer uma base de apoio sólida com o novo Congresso que é profundamente fragmentado.

“Da maneira como o estado brasileiro é organizado, vai demorar algum tempo para as medidas do governo Bolsonaro surtirem efeito”, prevê o especialista na entrevista à RFI Brasil.   

A montagem do ministério refletiu, segundo Santoro, o conjunto de três tendências políticas: religiosa, militar e dos liberais na economia. “Ainda não está claro como essas tendências contraditórias vão trabalhar conjuntamente”, destacou. “Há divergências bastante expressivas entre elas, em particular na política externa”.

Por isso, os primeiros meses devem ser marcados pela busca de uma maneira dessa equipe heterogênea trabalhar coletivamente.

Congresso extremamente fragmentado

Outro grande desafio inicial para o novo chefe de Estado brasileiro será o relacionamento com o Congresso Nacional. “Essa é uma grande incógnita porque o ministério atual tem pouca participação de parlamentares, o que é algo raro desde a redemocratização do Brasil”, ressalta.

A governabilidade sem contar com uma maioria partidária no Congresso não é novidade desde a chegada ao poder de Fernando Collor, em 1990. No entanto, o especialista destaca duas particularidades deste novo cenário político.

“Primeiro, é o Congresso mais fragmentado da história do Brasil. Nunca houve tantos partidos representados no mesmo Congresso, são 30”, lembra.

O PT, que fará oposição, elegeu o maior número de deputados, 56, enquanto o PSL, partido do novo presidente, contará com 52 representantes na casa. Cerca de 80% dos congressistas são representados por 28 partidos, por isso será difícil compor uma base sólida no Congresso, avalia Santoro.

“Vai ser mais difícil fazer coalizões e montar bases de apoio. Provavelmente elas terão que ser feitas em cada votação importante, caso a caso”, estima.

A segunda observação é a composição da equipe de governo, com nomes que não representam os grandes partidos políticos. Integram o gabinete de Bolsonaro só ministros oriundos do DEM e do próprio partido do presidente. “Isso cria um vazio que será difícil de preencher. Há muita discussão para saber se essa montagem do gabinete vai se sustentar”, avisa.

Diante dessa situação, o professor da UERJ não descarta a possibilidade de o novo presidente se ver obrigado a fazer um remanejamento ministerial dentro de alguns meses para acomodar nomes indicados por congressistas.

Falta de experiência política pode ser obstáculo

Em sua análise, Santoro indica que a escolha dos ministros seguiu uma lógica: a opção de nomes oriundos das duas instituições em que o brasileiro ainda expressa muita confiança, ou seja, as Forças Armadas e a Igreja.

“Apesar de toda a descrença nos políticos em geral, no Brasil os governantes precisam dos políticos tradicionais para governar”, afirma.

O cenário é de fragilidade neste início do governo bolsonarista. “O que podemos observar desde o início da redemocratização do Brasil é que os presidentes que perderam a capacidade de diálogo com o Congresso não terminaram os seus mandatos”, lembrou o professor ao citar os casos de Fernando Collor e Dilma Rousseff, que tiveram seus governos encurtados devido a processos de impeachment.

“É essencial para um presidente manter a maioria no Congresso por meio de negociações, que chamamos de presidencialismo de coalizão”. 

Jair Bolsonaro adiantou que pretende governar sem ceder às pressões para indicações de nomes para direção de estatais e de outros cargos  em órgãos públicos. Se o presidente que toma posse neste dia 1° vai conseguir pôr fim a essa antiga prática é uma grande incógnita. “Fica a dúvida de até quando Bolsonaro poderá governar sem esse tipo de arranjo”.  

Outro desafio da nova equipe que comandará o Brasil será uma equipe com pouca ou nenhuma experiência política. A presença de nomes de militares e do ex-juiz Sérgio Moro para a pasta da Justiça respondem a anseios manifestados pelos eleitores de caras novas na política, mas essa renovação pode esbarrar em obstáculos.

“Temos uma série de militares que nunca tiveram experiência política e irão assumir pastas como o Gabinete da Segurança Institucional, Ciências e Tecnologia e Defesa. Ter novos nomes na política é interessante, traz uma imagem de renovação. Mas ter a maioria do gabinete formado por esse tipo de personalidade pode também se tornar um problema, em particular dessa fragilidade do governo com o Congresso. Não é simples, não é trivial gerenciar um ministério no Brasil, desenvolver essa relação com o Congresso. É um desafio enorme”, conclui.

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