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Linha Direta

“Bolsonaro começa a entender que precisa dialogar com legislativo”, diz analista

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Jair Bolsonaro iniciou maratona de negociações para garantir apoio para a reforma da Previdência. Depois de receber líderes de seis partidos nessa quinta-feira (4), o presidente disse que Congresso fará sua parte. Os políticos, cautelosos, indicam que vão modificar texto e que é cedo para dizer se farão parte da base aliada.

O Palácio do Planalto incluiu hoje (3) o retrato oficial do presidente Jair Bolsonaro na Galeria dos Presidentes da República
O Palácio do Planalto incluiu hoje (3) o retrato oficial do presidente Jair Bolsonaro na Galeria dos Presidentes da República Valter Campanato/Agência Brasil
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Raquel Miura, correspondente da RFI em Brasília

Prestes a completar cem dias, o governo tirou pouca coisa do papel e ainda tem o desafio de construir uma base política. O voto de confiança que em geral marca o início de um governo foi minado por polêmicas alimentadas pelo próprio presidente e pessoas próximas.

Mas, numa tentativa de conseguir apoio para aprovar a prioridade número 1 do governo, a reforma da Previdência, Jair Bolsonaro começa finalmente a dialogar com quem pode ajudar, dando início a uma maratona de reuniões com os presidentes de vários partidos. Eles saíram do Palácio do Planalto com um discurso de apoio às mudanças nas regras das aposentadorias, mas reforçando que irão modificar o texto e que não vão aderir ao governo de pronto. Mesmo o mais alinhado com o Planalto, o Democratas, que tem três ministérios e comanda a Câmara e o Senado, diz que vai fechar questão sobre a reforma só quando o assunto estiver no plenário.

“O fechamento de questão à reforma vai depender do texto que for votado no Plenário. Temos a comissão técnica, depois a especial e o texto deve ser mudado. Então vamos apoiar totalmente quando o texto do plenário estiver de acordo com a maioria do partido”, disse ACM Neto, presidente do DEM.

Os políticos elogiaram o gesto e a disposição do governo em criar um Conselho de Presidentes Partidários, com reuniões periódicas sobre os assuntos nacionais. Mas, cautelosos, dizem que vão esperar para ver os desdobramentos na relação diária com o Legislativo.

Centrão cobra posição efetiva do Planalto

Nos bastidores, partidos que desejam ser governo, mas não viram seus pleitos atendidos até aqui cobram uma posição efetiva do Executivo, especialmente as legendas do chamado Centrão – partidos de centro-direita que têm um peso muito grande na hora do voto e que estiveram com Lula, Dilma, Temer e, se der, estarão com Bolsonaro.

Eles querem ser recebidos por ministros de estado para discutir projetos para seus municípios, querem emendas que atendam seus redutos eleitorais e, vários também querem cargos. Dizem que, se vão ajudar o governo a tocar reformas importantes, porém impopulares, precisam ser considerados na hora de governar. O vice-presidente Hamilton Mourão considera razoável tal negociação

“O governo tem que dizer com clareza quais são nossos objetivos, ver se os partidos concordam e podem apoiar esses objetivos e, num segundo passo, o presidente pode decidir por oferecer algum tipo de cargo nos estados ou aqui na Esplanada”, disse o vice.

Mas o presidente, após encontro com os líderes partidários, manteve o discurso da nova contra a velha política e respondeu ao próprio vice:

Nada foi tratado sobre cargo, nem de nossa parte, nem da deles. Quem falou em cargo, caiu do cavalo”.

Bolsonaro disse que as reuniões foram proveitosas e que ele está otimista de que o Congresso fará sua parte. A favor do governo há o próprio tema, que, embora mexa com as aposentadorias, conta hoje com apoio de boa parte dos congressistas devido ao rombo nas contas previdenciárias. Porém também é consenso na Câmara que não dá para acabar com a aposentadoria rural nem diminuir, como propõe o texto governo, os valores pagos a famílias carentes inscritas no Benefício de Prestação Continuada. O tamanho dessa desidratação vai mostrar a força do Planalto.

Governo redefine forma de lidar com Congresso

O analista político Creomar de Souza, da Universidade Católica de Brasília, diz que o governo achou que a pressão das redes sociais que embalou a campanha Bolsonaro teria por si só ecos no Congresso, o que não aconteceu. E que o governo, com mais de três meses após a posse, está redefinindo a forma de lidar com o Legislativo:

“O governo diz que quer mudar a regra do jogo, é a nova política, mas não definiu quais são as regras desse novo jogo, e isso gera expectativa no Congresso. O governo terá ouvir e atender os pleitos do Legislativo, mas isso não significa que terá de realizar costuras que ferem a ética”, disse o especialista.

O próprio partido do presidente, do PSL, reconhece que a forma como se deu a audiência do ministro da Economia na Câmara esta semana é prova de que o governo precisa e muito articular uma base. Paulo Guedes foi exposto às críticas duras da oposição, sem qualquer respaldo ou blindagem política de aliados.

Não dá para avançar na construção de uma base de apoio se o governo se recusa a conversar. E esses encontros de Bolsonaro com partidos é um sinal positivo, de que ele está começando a entender de que é preciso sentar na mesa e dialogar”, concluiu Souza.

Discurso Ideológico

A avaliação de muitos interlocutores do governo, especialmente o núcleo duro formado por militares, é de que o discurso ideológico tem causado muito mais estragos do que construído pontes num momento em que o governo precisa ampliar apoio. A avaliação é de que ficar repetindo o que deu certo na campanha, só reforça a base de quem já está com o governo e nada ajuda.

Além do próprio presidente, dois ministérios têm protagonizado essas declarações. No ministério da Educação já foram 14 demitidos nesse início de governo, em meio a uma verdadeira briga interna por poder, com o ministro Ricardo Velez sem credibilidade dentro do próprio governo. A avaliação do próprio planalto é de que além de não ter conseguido montar uma equipe, ele se envolve em polêmicas que não trazem nada de útil ao governo, como a proposta de revisar os livros de história sobre o golpe de 1964.

Outro que insiste em declarações polêmicas é o ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo. Ele, que tem insistido em relacionar o nazismo à esquerda, visão condenada por muitos acadêmicos, foi ao Senado nesta quinta-feira e disse que é preciso revisar a história para esclarecer as novas gerações.

“Acho que é preciso evitar uma lavagem cerebral, onde uma determinada perspectiva é dada como certa, como imutável. Todas as gerações devem ter direito de rediscutir a história de uma forma mais aberta, disse o chanceler.

Essas controvérsias mostram que, além de melhorar a negociação com o Congresso, o governo precisa focar em propostas concretas, que realmente possam fazer diferença para a população.

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