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Reportagem

Religiosos da Amazônia defendem introdução das tradições indígenas em rituais católicos

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Qual o espaço das tradições e culturas dos povos ancestrais da Amazônia nas celebrações e nos rituais católicos? A inculturação é um dos temas que vai mobilizar os bispos, padres, religiosos e representantes das comunidades indígenas durante o Sínodo da Amazônia, que teve início no dia 6 de outubro no Vaticano. 

Procissão católica no Parque das Tribos, na periferia de Manaus
Procissão católica no Parque das Tribos, na periferia de Manaus Foto: RFI/ Elcio Ramalho
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Enviado especial a Manaus

Nem a chuva e o barro das ruas sem asfalto impedem o pequeno grupo de fieis católicos de sair em procissão pelo Parque das Tribos. A área na periferia oeste de Manaus é ocupada por 35 etnias indígenas. Das 700 famílias, menos de 200 são católicas. À frente da procissão, a imagem de São Gabriel, padroeiro da futura igreja.

Em dois anos, a comunidade católica só conseguiu erguer quatro paredes e comprar cadeiras. Falta dinheiro para o teto. O plano é terminar o local de culto e atrair os fieis não praticantes que são alvos das igrejas evangélicas. “A maioria dos indígenas é evangélico e eles atacam mesmo, criticam dizendo que eles estão certos, e se a gente trocar de religião a gente estará salvo”,explica Pedro Cadena, de 63 anos, um dos líderes da comunidade católica local. 

No sábado de festa e homenagem a São Gabriel, um padre celebra a missa à luz de velas e de aparelhos celulares. Durante a liturgia, muitos cantos e leituras na língua tucana, comum na região do Alto do Rio Negro, além de bandeiras e outros elementos das tradições.

O indígena Pedro Cadena na frente da Igreja de São Gabriel, ainda em construção no Parque das Tribos, na periferia de Manaus.
O indígena Pedro Cadena na frente da Igreja de São Gabriel, ainda em construção no Parque das Tribos, na periferia de Manaus. Foto: RFI Brasil/ Elcio Ramalho

Oficializar a inculturação, ou seja, o respeito e a introdução de elementos das culturas indígenas nas celebrações religiosas, é uma das propostas do Sínodo da Amazônia e defendida por muitos religiosos, como o padre sacramentino Valdecir Paulo Martins, que celebrou a missa em homenagem ao padroeiro.

“O Sínodo vai trazer muitas coisas boas e importantes. Estou na expectativa que venha ajudar muito essa cultura que está sendo cada vez mais desprezada, às vezes pela própria Igreja, mas principalmente pelo poder público, que não está preocupado com essa preservação. Então, o Sínodo está sendo uma motivação e vai trazer muitas coisas para estarmos refletindo e trabalhando com eles para que eles possam estar preservando e continuar acreditando dentro daquilo que é a cultura dele para continuarem suas vidas”, argumenta.

O padre francês Robert Devalicourt se opõe à rigidez e imposição dos ritos atuais nas missas e celebrações religiosas na região amazônica. 

“Não sou a favor dessas liturgias romanas aqui para os indígenas, com coroinhas de roupas vermelhas, tudo sem movimentação. Não se pode cantar agitando as mãos porque é proibido, a liturgia não permite. Isso para mim é uma negação da cultura. Estamos na Amazônia, a gente vai celebrar missa como em Roma ou em Paris? Não cola”, diz, indignado.

Diálogo interreligioso

Primeiro padre indígena salesiano ordenado de São Gabriel da Cachoeira, Justino Sarmento Rezende, de 58 anos, participou da elaboração do documento do Sínodo e será um perito nas reuniões no Vaticano. Para ele, a Igreja pode corrigir um erro histórico, mas sem “endeusar” as culturas indígenas e favorecer um diálogo interreligioso.

“Vai precisar de um diálogo interreligioso e ecumênico com as igrejas evangélicas para não impedir que os indígenas ou os povos da Amazônia vivam seus valores culturais. A crítica que se faz às igrejas evangélicas hoje é que elas estão impedindo os indígenas de viver suas culturas tradicionais, como nós fazíamos no passado. Hoje, pensamos diferente”, afirma, em referência às propostas incluídas no documento do Sínodo de inculturar essas tradições dos povos originários. 

O padre jesuíta paraibano, Vanildo Pereira, 38 anos, que atua na pastoral indígena da arquidiocese de Manaus e também na assessoria jurídica do Conselho Indigenista Missionário, defende que a Igreja Católica respeite os diferentes grupos indígenas da região na sua nova perspectiva de evangelização.

“Na Amazônia temos povos que conservam as suas tradições origininárias, crenças próprias. O que nós temos que fazer é conhecer e respeitar o diálogo interreligioso. E temos que respeitar o modo próprio deles, e respeitar sua espiritualidade. Mas na Amazônia, temos um grupo grande de indígenas já tiveram contato com o catolicismo, já foram batizados. Esse sim, vamos tratar de fazer esse trabalho de inculturação e levar adiante esses métodos de evangelização com eles”. 

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