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Cobaia humana pode ganhar R$ 20 mil para testar medicamentos na França

A morte de um francês neste fim de semana, após ter participado de um programa de testes realizados por um laboratório, trouxe novamente à tona a questão dos riscos das experiências médicas feitas em seres humanos. Atraídos pelas compensações financeiras, muitos voluntários arriscam a vida, sem ter ideia das consequências.

Fachada do laboratório francês Biotrial, que realizou os testes que provocaram a morte de um voluntário.
Fachada do laboratório francês Biotrial, que realizou os testes que provocaram a morte de um voluntário. REUTERS/Stephane Mahe
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Antes que um medicamento seja colocado no mercado, ele é testado in vitro e em animais de pequeno porte, como ratos, coelhos ou chimpanzés. Em seguida, testes clínicos são realizados em seres humanos, seguindo protocolos de segurança restritos para evitar acidentes e, na medida do possível, controlar os efeitos colaterais.

No entanto, o caso do paciente francês, que fazia parte de um grupo de voluntários que testava os efeitos de uma molécula para tratar problemas de humor e ansiedade, mostrou que os riscos podem ser maiores que os esperados. O grupo farmacêutico português Bial, fabricante do medicamento experimental, garantiu na sexta-feira (15) que respeitou as regras internacionais e a "legislação" vigentes. Mesmo assim, além da vítima fatal, pelo menos quatro pacientes, com idades entre 28 e 49 anos, que desenvolveram distúrbios neurológicos, ficaram em observação.

“Estamos profundamente chocados com toda essa situação. Nossa equipe está na França, mas também em Portugal, trabalhando incansavelmente para entender as causas desse acidente, mas principalmente para garantir que os demais pacientes que se encontram hospitalizados possam se recuperar”, declarou o presidente-executivo da Bial, António Portela. O procedimento que levou à morte do paciente foi feito pelo laboratório privado francês Biotrial, que realiza estudos farmacêuticos há mais de 20 anos, principalmente no desenvolvimento de novos medicamentos contra dor, Alzheimer e antibióticos, sempre supervisionado pelo ministério francês da Saúde.

Testes por razões financeiras

Para o francês Simon*, que faz parte dos voluntários do mesmo do programa de testes clínicos da Biotrial, os pacientes sabem que há possíveis efeitos colaterais. Mas “nunca pensamos que podemos morrer”, comenta. Ouvido pela rádio France Info, ele conta que levou um susto com a notícia e que vai esperar um pouco antes de fazer novos testes, mesmo se não pretende abandonar a prática.

Já William*, que é voluntário nos programas da Biotrial há quinze anos, ressalta que esse tipo de procedimento contribui para o avanço da medicina. No entanto, “honestamente, as razões financeiras pesam muito, pois consigo ganhar mais de € 4 mil (quase R$ 20 mil), livres de imposto”, pondera. Outro voluntário do mesmo grupo, revela que ganhou € 800 para o teste que provocou a morte do paciente francês. 

O governo francês impõe o limite de € 4.500 por ano para evitar os abusos. Além disso, o mesmo paciente não pode fazer mais de três testes anuais.

Diante dessas restrições e do custo que os procedimentos podem representar, alguns laboratórios recorrem aos países emergentes para experimentar novas moléculas. Índia ou China, mas também a América Latina e o leste europeu sempre fornecem “cobaias humanas” para as empresas farmacêuticas ocidentais, em um mercado estimado em € 1,5 bilhões por ano.

Como funciona no Brasil

Os ensaios clínico no Brasil são realizados apenas após a aprovação da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). A entidade proporciona a regulamentação adequada para os testes e garante a segurança e os direitos dos voluntários.

Até 2012, a remuneração de participantes das pesquisas médicas era proibida no Brasil. No entanto, uma resolução autoriza, desde 2013, o pagamento daqueles que permitem que substâncias ainda em estudo sejam testadas em seu organismo. Os voluntários, que podem ter entre 18 e 50 anos, são pagos entre R$400 e R$3 mil por teste.

O Brasil ocupa o 15º lugar no ranking mundial de pesquisa clínica e nenhum incidente foi registrado nos procedimentos autorizados pela Anvisa. Em 2014, a agência aprovou 168 ensaios clínicos. Cada ensaio é testado em vários voluntários e estima-se que pelo menos mil testes são realizados simultaneamente no país.

*Os nomes dos voluntários foram trocados.

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