Erradicar o vírus zika é impossível, diz pesquisadora do Instituto Pasteur
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Diante do aumento dos casos de microcefalia no Brasil associados ao zika, as autoridades públicas e os cientistas se mobilizam para combater a epidemia e promover avanços nas pesquisas sobre o vírus transmitido pelo mosquito do tipo aedes, o mesmo que provoca a dengue e a chikungunya.
Até o dia 16 de janeiro, já foram registrados no país 3.893 casos de microcefalia, doença que provoca um crescimento anormal da caixa craniana. Pernambuco, o primeiro estado brasileiro a identificar o surto, já registra quase 1.306 casos, o maior número até agora desde que as estatísticas começaram a ser feitas.
Desde novembro, o estado obriga a notificação de mulheres grávidas que apresentem exantema, ou seja, manchas avermelhadas na pele que possam indicar os riscos de microcefalia no feto. “Estamos recebendo notificação das gestantes com exantema durante o exame pré-natal ou quando elas procuram os médicos com esse sintoma. O estado garante o exame para identificar o zika, mas também a dengue a chikungunya”, afirma Patrícia Ismael, Diretora Geral de Ações Estratégias em Vigilância em Saúde.
O governo pernambucano faz campanha para as grávidas consultarem os médicos logo que aparecem os sintomas de exantema. "A maior incidência da doença é quando as mulheres grávidas estão com as manchas. Se passar o exantema, a gente pode não ter mais como detectar se elas tiveram dengue, chikungunya ou zika", diz. Segundo Patrícia, depois é dfeito um segundo ultrassom entre a 32ª e 35ª semana de gestação para confirmar o risco de uma microcefalia intra-uterina.
Pequisas em curso sobre vírus e microcefalia
Enquanto as autoridades públicas buscam respostas para frear a epidemia, pesquisadores se mobilizam para entender melhor o vírus e o processo de transmissão. O agente vetor do zika é o mesmo da dengue e da chikungunya.
Na semana passada, um grupo de pesquisadores do centro médicosda Fiocruz em Curitiba anunciou ter identificado o vírus na placenta de uma mulher que teve um aborto espontâneo, o que comprovaria que o vírus pode atingir o feto. Até então, os médicos haviam apenas encontrado o vírus zika no líquido aminiótico de duas mulheres grávidas.
O Instituto Pasteur, em Paris e na sua unidade na Guiana Francesa, também realiza pesquisas para melhor entender o funcionamento do mosquito e a relação do zika com a microcefalia. Um primeiro passo já foi dado com o sequenciamento do mosquito vetor, o aedes aegypti.
No entanto, ainda é preciso realizar mais investigações sobre a relação entre o vírus e os casos de microcefalia. Em entrevista à RFI Brasil, Anna Bella Failloux, diretora responsável da Unidade arbovírus e Insetos vetores do Instituto Pasteur afirma que o estágio atual da pesquisa sobre esse assunto não permite estabelecer um vínculo concreto.
“Atualmente, investigamos como o vírus, mesmo com uma carga viral muito alta, pode afetar o desenvolvimento do bebê, particularmente em relação ao cérebro. Não sabemos exatamente como acontece, mas existe uma correlação no fato de que a mãe esteja infectada no início da gravidez e os sintomas dramáticos do zika. Mas ainda não há ainda resultados concretos de pesquisas e investigações para identificar as causas. Estamos trabalhando para entender como ocorre essa transmissão”, afirma.
Atualmente o Instituto Pasteur desenvolve dois métodos alternativos de pesquisa em laboratório com mosquitos para entender a transmissão vetorial. Como uma espécie de mosquito em um dado local é capaz, depois de ter sugado sangue contendo o vírus seja capaz de transmitir a uma outra pessoa através da saliva da fêmea que vai injetar nesta pessoa. É preciso entender esse mecanismo para propor soluções”, diz.
“Mosquitos incompetentes”
Segundo Anna-Bella Failloux, uma das linhas de investigação está associada com empresas que desenvolveram mosquitos transgênicos. Elas criaram novso tipos para serem dispersados na natureza com o objetivo de se acoplar com os mosquitos existentes, chamados de “selvagens”. A ideia é provocar uma descendência que não será viável para a transmissão do vírus. “Despejando mosquitos transgênicos na natureza, a tendência é diminuir a densidade desses mosquitos”, afirma.
A segunda possibilidade é desenvolver e “largar” na natureza mosquitos considerados “incompetentes” para transmitir o vírus. A quantidade de mosquitos não iria diminuir, mas eles seriam incapazes de propagar o zika.
“O Instituto Pasteur propõe essa segunda opção porque eliminar totalmente esse mosquito, erradicá-lo, criaria um ‘vazio ecológico’ que poderia ser ocupado por outro mosquito. Esse novo mosquito poderá ser ainda mais perigoso do que o mosquito erradicado”, afirma. “É por isso que defendemos essa alternativa porque vai evitar a colonização desse ‘vazio ecológico’ e substituir uma espécie pela mesma, mas incapaz de transmitir o vírus”, garante Failloux.
O Brasil já efetua testes com mosquitos transgênicos como o desenvolvido pela empresa Oxitec e de outros consórcios que utilizam uma bactéria capaz de limitar a transmissão do vírus da dengue. Segundo failloux, o governo brasileiro autorizou o uso de testes com o objetivo de encontrar métodos para tentar combater essas doenças e patologias ligadas aos vírus diante das consequências graves para a economia.
“Estamos no começo das pesquisas. Ainda não há muitas pessoas trabalhando sobre o zika. Porque só ouvimos falar dele em 2007 quando apareceu no Pacífico e em 2015 quando surgiu no Brasil. Nosso conhecimento sobre esse vírus ainda é mínimo. Vai ser preciso um certo tempo para os pesquisadores entenderem e trabalharem com esse vírus”, garante.
Erradicar o vírus da zika é impossível
Segundo Anna-Bella Failoux, a direção do Instituto Pasteur em Paris demonstra disposição em envolver as 18 unidades de pesquisa do departamento de virologia para contribuir para frear a expansão da epidemia. O Instituto Pasteur realiza investigações em parceira com o Instituto Osvaldo Cruz no Brasil, Instituto Pasteur da Guiana Francesa e da Guadalupe, da Nova Caledônia e um instituto de Dakar, no Senagal, onde também existe um foco importante de epidemia ligada ao mosquito do tipo aedes.
O vírus não é mortal, mas complicações neurológicas foram identificadas na Polinésia Francesa, foco de uma epidemia com casos desenvolvidos da síndrome de Guillan-Barré e sintomas como paralisia e dificuldade de controle dos músculos respiratórios.
Mas 70% dos casos são assintomáticos, ou seja, a pessoa não desenvolve sintomas. Ela tem o vírus, está infectada, mas não desenvolve os sintomas típicos do zika: Febre, dores de cabeça, e dores nas articulações. Em geral, o vírus não é mortal e é benigno.
Para melhor entender a cadeia de transmissão, pesquisadores precisam ainda identificar se os humanos podem transmitir o vírus para o mosquito. “A questão que nos colocamos é: uma pessoa que aloja o vírus é capaz de estar na origem da contaminação do mosquito que a pica? Para isso, é preciso fazer testes com pessoas assintomáticas, retirar seu sangue, dar ao mosquito para saber se esse mosquito é capaz de transmitir. Temos que começar a fazer esse tipo de estudo”, defende a diretora do Instituto Pasteur.
“É preciso identificar as pessoas contaminadas, retirar o sangue, isolar o vírus e transmitir ao mosquito. Mas para isso, é preciso fazer em laboratórios do tipo 3, de alta segurança, para poder manipular o vírus, o mosquito e fazer os testes de transmissão”, explica.
O mosquito se reproduz em áreas tropicais mas também em zonas temperadas. Na Europa, o aedes albopictus, mesmo vetor de doenças do aedes egypti, está presente em 21 países e em várias regiões do sul da França. A única coisa que pode pará-lo é a temperatura.
“A erradicação desse mosquito é impossível. O aedes aegypti e o aedes albopictus são duas espécies invasivas porque eles apresentam ovos que têm uma casca impermeável e permite ao ovo sobreviver. Isso quer dizer, se eu colocar um ovo em cima de uma mesa e depois de seis meses, abrir a casca, a larva vai sair. O que está dentro do ovo ainda vai estar vivo. É assim que esse mosquito vai invadir o mundo. Esse ovo não será morto por inseticidas. Os inseticidas vão matar os adultos, mas não os ovos e por esse motivo por isso nunca poderemos falar de erradicação deste mosquito”, afirma.
Por enquanto, não há sequer uma previsão mínima de quando uma vacina poderá surgir a partir das pesquisas. “Acredito que equipes poderão se interessar em desenvolver vacinas. Mas isso vai depender essencialmente de recursos. Desenvolver uma vacina custa caro e leva tempo. Se for necessário desenvolver uma vacina será necessário fazê-lo, custe o que custar”, afirma Failloux.
“Vai depender de vontade política. A ciência está ligada à vontade política. Se essa vontade existe, não sei. Até agora não ouvi falar sobre o interesse no desenvolvimento de uma vacina”, completou.
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