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Moda

Marcas britânicas e americanas transformam ritual dos desfiles de moda

Esta temporada dos desfiles de prêt-à-porter está sendo marcada pelos primeiros shows que adotaram o sistema do "see now, buy now" (veja agora, compre agora). Ao contrário da tradição do setor, a partir de agora os consumidores poderão comprar as peças das grifes de luxo imediatamente após a apresentação nas passarelas. A mudança é fruto de discórdia entre os atores da indústria do vestuário.

Burberry apresentou o seu primeiro desfile seguindo o sistema do "see now, buy now"
Burberry apresentou o seu primeiro desfile seguindo o sistema do "see now, buy now" REUTERS/Neil Hall
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O desfile da britânica Burberry, realizado na noite desta segunda-feira (19) em Londres, era um dos mais esperados da temporada. Mas desta vez, a marca conhecida por seus casacos de chuva com forro xadrez era aguardada não apenas pelo estilo imaginado por Christopher Bailey. O público estava ansioso para conhecer a primeira coleção na qual poderiam comprar as peças antes mesmo do fim da apresentação.

Desde que o prêt-à-porter foi instaurado, nos anos 1940, e ganhou força duas décadas mais tarde, o sistema da moda cumpre um ritual que praticamente não mudou: no mês de setembro, as marcas apresentam as coleções primavera-verão que estarão nas lojas seis meses mais tarde, enquanto que, em março, é a vez da moda outono-inverno do ano seguinte ser exposta nas passarelas. Após os desfiles, os compradores das lojas de departamento e das butiques multimarcas fazem suas encomendas, as peças são fabricadas e entregues para serem vendidas alguns meses depois. Esse modelo em vigor no hemisfério norte inspirou o resto do mundo e rege até hoje boa parte da cadeia de produção e comercialização do setor.

No entanto, com a advento do fast fashion, com marcas como Zara ou H&M, que propõe novidades quase semanalmente, e com a facilidade de comprar roupas pela internet, algumas grifes decidiram que o ritmo da moda deveria ser acelerado. Na era da instantaneidade, do Instagram e do Snapchat, “os consumidores não vão mais às lojas duas vezes ao ano e não querem mais esperar vários meses para comprar o que veem nas passarelas”, como explicou porta-voz da Burberry.

A marca britânica não é única a querer mudar o sistema, considerado por alguns como obsoleto. Do lado dos norte-americanos, várias grifes aderiram ao "see now, buy now", como Ralph Lauren, que apresentou na semana passada uma coleção composta por 45 looks que podiam ser comprados imediatamente após o desfile. Ele foi acompanhado por Tom Ford, Tommy Hilfiger, Thakoon, ou encore Opening Ceremony, que decidiram colocar o pé no acelerador da moda de luxo.

Anglo-saxões se opõem a franceses e italianos

Mas o assunto divide, e criou uma verdadeira ruptura no setor. De um lado, norte-americanos e britânicos defendem o novo sistema, enquanto franceses e italianos, que representam os outros dois pilares do mundo do luxo, preferem manter o ritmo tradicional. François-Henri Pinault, presidente do grupo de luxe Kering (dono de marcas como Gucci, Saint Laurent, Alexander McQueen e Balenciaga) declarou que o novo dispositivo é “uma negação do sonho e do desejo” que alimentam o mundo do luxo. Mesmo tom do lado de Carlo Capasa, presidente da Câmara nacional da moda italiana, que considera o sistema um “ataque contra a criatividade”.

Isso porque, segundo eles – e muitos especialistas do setor –, ao aderir ao sistema da “moda instantânea”, as marcas passariam a apresentar nas passarelas apenas peças que teriam mais chance de serem vendidas. Afinal, nenhuma empresa baseada em fins lucrativos gostaria de fabricar coleções inteiras para que elas não saíssem do estoque. Seguindo essa lógica, com o "see now, buy now", as marcas ousariam menos e a moda perderia uma de suas dimensões mais importantes: a inovação.

Jovens estilistas são excluídos

Além disso, o sistema do “pronta entrega de luxo” deixa para fora do tabuleiro todas as pequenas marcas e os jovens criadores, que contam com o funcionamento do calendário para testar suas ideias. Atualmente, as grifes apresentam apenas protótipos nas passarelas. Essas peças são fabricadas em apenas uma referência, cor e tamanho, esperando para serem encomendadas antes de serem reproduzidas em série, em função do interesse dos compradores.

Dessa forma, muito do que é apresentado nas passarelas não será comercializado, mas tem o papel de laboratório da moda. Mas com o "see now, buy now", apenas as empresas capazes de investir milhões em coleções inteiras antes mesmo delas serem encomendadas, poderão seguir esse ritmo. Com o novo sistema, nomes como Jean Paul Gaultier, que fez sua primeira coleção com a ajuda de sua mãe, avó e até da zeladora do prédio, que costuraram as poucas peças apresentadas na passarela, nunca teriam emergido.

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