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Visa/Perpignan

Festival de fotojornalismo na França mostra feridas do mundo

Acontece em Perpignan, no sudoeste da França, o encontro anual dos fotojornalistas do mundo todo, de grandes nomes a aspirantes. Trata-se do festival Visa pour l’Image, em sua 29ª edição, que vai até o dia 17 de setembro.

Michael Araja (29 anos) foi morto numa batida policial.
Michael Araja (29 anos) foi morto numa batida policial. © Daniel Berehulak pour The New York Times
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Patricia Moribe, enviada especial a Perpignan

Prédios históricos da cidade dão lugar a exposições que refletem principalmente a atualidade do ano decorrido. Sem surpresas, guerras e conflitos, atentados e massacres dominam. Mas há também questões ambientais, dramas humanos e combates políticos.

Paralelamente, o evento discute os caminhos do fotojornalismo. O diretor do festival, Jean-François Leroy, observa que muitos projetos apresentados tinham Mossul como tema, mas lembra ao mesmo tempo que o mundo foi sacudido por cerca de trinta confrontos armados no mundo. Ele aproveita para perguntar a responsáveis de publicações por que não dar mais espaço a guerras que pipocam na África (Mali, Burundi, Congo, Somália, Sudão do Sul e outros)? Ou às guerras do narcotráfico no México ou nas Filipinas.

Civis aproveitam pausa em confrontos para deixar suas casas, entre Gogjali e o vilarejo de Bazwaya a leste de Mossul (6/11/16).
Civis aproveitam pausa em confrontos para deixar suas casas, entre Gogjali e o vilarejo de Bazwaya a leste de Mossul (6/11/16). © Alvaro Canovas / Paris Match

 

Brasileiro fake

A ética da profissão também é amplamente discutida em encontros e debates. Leroy citou em público, durante uma das concorridas projeções noturnas ao ar livre, o lamentável caso de um misterioso fotojornalista brasileiro que enganou meio mundo, roubando fotos de outros profissionais e até dando entrevistas a revistas consagradas. Até as fotos do perfil, mostrando um homem loiro, fã de surfe, também eram falsas. “Não vamos mostrar nenhuma foto dele aqui, isso eu garanto a vocês”, afirmou, com ironia e indignação.

O festival propõe um giro pelo mundo, não só a Mossul. A americana Meridith Kohut mostra uma Venezuela à beira do precipício, com imagens da população minguando diante da falta de comida, de hospitais sucateados e pacientes esqueléticos em hospitais psiquiátricos.

O chinês Lu Guang revela o outro lado da moeda do desenvolvimento acelerado da China: populações convivendo com a poluição e o câncer, o cotidiano de crianças cobertas de fuligem, rios contaminados. Imagens violentas que revelam o frágil equilíbrio entre homem e natureza.

Indústrias poluentes, homens e animais compartilham convivem na Mongólia Interior.
Indústrias poluentes, homens e animais compartilham convivem na Mongólia Interior. © Lu Guang

Inundação climática

O russo Vlad Sokhin arranha o português, mas seu forte mesmo é falar sobre as consequências das mudanças climáticas, do norte do Alasca descendo até os confins da Nova Zelândia. A exposição “Warm Waters” (Águas Quentes) traz vilarejos submersos e crianças inuit em geleiras derretendo. Uma parte do grande projeto, relativa ao arquipélago de Kamchatka, no extremo leste da Rússia, ganhou o prêmio Visa de Ouro de Informação Digital, com apoio da RFI.

As mulheres também estão bastante presentes nesta edição, atrás e diante das câmeras. Angela Ponce Romero mostra as vítimas dos conflitos entre Sendero Luminoso e forças oficiais em um remoto vilarejo montanhoso no interior do Peru. A americana Amy Toensing trata da viuvez em países em que perder um marido traz muito mais sofrimento que a morte de um ente querido.

O combate sangrento às drogas do presidente filipino Rodrigo Duterte estampou reportagens do New York Times, com fotos de Daniel Berehulak, que não economizam corpos abatidos, população indefesa, desespero de crianças, em composições e cores de triste poesia. Mais de duas mil pessoas já foram mortas oficialmente pela polícia nos primeiros seis meses do mandato do falastrão Durterte.

As fotos de Sarah Caron trazem as cores quentes de Cuba para um assunto inusitado: os muçulmanos de Havana. Isadora Kosofky acompanha adolescentes que passam pelo sistema carcerário americano e como a experiência marca o início de suas vidas como adultos.

O cotidiano dos muçulmanos em Havana, Cuba.
O cotidiano dos muçulmanos em Havana, Cuba. © Sarah Caron para Le Figaro Magazine

Profissão de fascínio

As imagens são marcantes e muitas tiram o fôlego e deixam material para reflexão. São os indígenas americanos que sofrem com o alcoolismo ou com a ameaça de um oleoduto, o belo cotidiano de animais selvagens, a Itália sacudida por terremotos, uma nova epidemia, refugiados, a resistência dos berberes no Marrocos e, claro, Mossul.

O público pode acompanhar também visitas guiadas pelos próprios fotógrafos, encontros sempre apinhados de jovens aspirantes, que perguntam e perguntam. Os profissionais respondem e dão dicas valiosas. Prova de que a profissão ainda atrai, apesar da alta competitividade (de fotógrafos e da internet).

© Zohra Bensemra
© Zohra Bensemra Visa pour l'image© © Zohra Bensemra / Reuters

A veterana Zohra Bensemra fala do amor pelo ato: “quando eu tiro uma foto, é como ler um livro todo, de uma só vez”. Mas como tantos outros, ela insiste que “fotografia é sobretudo sentimento, é uma questão de coração”. Ela já cobriu conflitos ao redor do mundo e rebate a observação de que o fotojornalismo é um trabalho masculino. “Deus deu olhos tanto para o homem, quanto para a mulher”, afirma.

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