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“Lutamos tanto para conquistar um pouco de direitos humanos e a gente vai retirar isso?” questiona Marcelo D2 em entrevista em Paris

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Músico, compositor e agora cineasta. Marcelo D2 está em turnê pela Europa para divulgar o álbum visual “Amar é para os Fortes”. Num momento em que a música está cada vez mais ligada à imagem, o cantor estudou roteiro e produziu um filme estrelado pelo próprio filho. Ele conversou com a RFI sobre essa nova fase da carreira e assuntos da atualidade, como violência, combate às drogas e a política atual.

O músico Marcelo D2
O músico Marcelo D2 RFI
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Para ver a intrevista na íntegra, clique no vídeo abaixo.

As turnês no velho continente são uma rotina na carreira de Marcelo D2 desde 1998. O cantor faz show nessa sexta-feira (5), na Machine do Moulin Rouge, em Paris, onde apresenta seu décimo disco.   

“Estamos vivendo um momento em que os valores estão se perdendo, de excesso de consumismo. Já faz tempo que eu queria escrever sobre o amor, o amor ao próximo. É um momento especial para mim, meu décimo disco e por isso esse álbum é uma ambição artística também, um passo à frente”, diz.     

A popularização dos smartphones e do streaming pela internet facilitou o acesso dos fãs aos videoclipes. Surfando nessa onda, Marcelo D2 produziu e dirigiu um filme que conta a história de um jovem pobre, morador da periferia e que luta para sobreviver.

“É quase autobiográfico. Eu escrevi o roteiro não pensando na minha vida e sim nesse personagem que parecia ser fictício, mas acabou se tornando bem real e parecido comigo. Não escrevi para o meu filho, mas conversamos sobre a possibilidade dele interpretá-lo. Eu resolvi trabalhar com não atores e eu acredito que agora, além de músico e compositor, eu sou, também, diretor de cinema”, afirma o carioca.  

Guerra às drogas

Nascido e criado nos subúrbios da zona norte do Rio de Janeiro, frequentador da boemia da Lapa, D2 conhece, também, a violência das favelas. Numa entrevista recente, afirmou que não se pode confundir justiça com vingança. Ele falou à RFI sobre o fracasso da estratégia de combate ao tráfico de drogas no Brasil.

“Está bem claro que essa guerra às drogas faliu, não vai dar certo, é tapar o sol com a peneira. Não é nem um paliativo, porque não diminui a violência a curto prazo. Antes, eu achava que as pessoas não estavam entendendo que isso estava dando errado, mas agora eu tenho clareza que é má vontade mesmo”, diz D2. “De uma certa forma, você exclui uma parcela da sociedade, principalmente jovens, negros e pobres de favelas e periferias. Me parece hipocrisia conversar sobre isso em 2019, de ainda haver esse sonho americano de poder erradicar as drogas”, acrescenta.

Voz polêmica

O carisma, a ginga e as rimas irreverentes marcam a trajetória de Marcelo D2. Ao denunciar os problemas sociais do Brasil, o músico também se tornou uma das figuras mais polêmicas de sua geração, tendo recebido várias ameaças.

“Mas é claro que eu vou me tornar uma pessoa polêmica”, diz. “Um jovem que saiu da favela e conquistou o que eu conquistei, isso gera polêmica. As pessoas não querem ouvir. Quem tem privilégios deveria ter consciência de seus privilégios. Quando eu fiz o Planet Hemp, em 1994, a minha vida mudou. Eu vi que fazia parte desse mundo também e passei a ter voz”, afirma.

Desde as últimas eleições no Brasil, D2 se tornou bastante presente nos debates políticos nacionais. O compositor escreve sobre os desafios do Brasil nas redes sociais, onde troca muitas ideias com seus seguidores. Marcelo D2 diz que o mundo ficou mais difícil para as minorias e que não se pode confundir conservadorismo com atraso.

“Isso tem sido uma onda mundial, a gente vê com o Trump, com tantos presidentes pelo mundo que me fazem pensar assim. No Brasil, a gente lutou tanto para conquistar um pouco de direitos humanos, principalmente para negros, gays, mulheres e uma população pobre, e a gente vai retirar isso de novo?”, pergunta.  “Quando se fala em conservadorismo, com a ideia de que as coisas não devem mudar, é importante dizer que vivemos num mundo desigual e que precisamos avançar. Em poucos meses do governo Bolsonaro, a gente teve um retrocesso gigante, andamos para trás e perdemos direitos que pareciam óbvios”.

O começo da fama

Antes de fazer sucesso na música, Marcelo D2 foi office-boy, porteiro, servente e camelô. A fama veio em 1995, já no disco de estreia da banda Planet Hemp, da qual era o vocalista. Cheio de brasilidade e “carioquice”, o álbum tinha letras que discutiam a apologia às drogas.

“As letras do Planet Hemp eram sobre a guerra às drogas, violência policial, tudo isso que estamos falando até hoje. É muito triste ver que, depois de 25 anos, as letras do Planet Hemp ainda são atuais“, analisa.

Sem medo de experimentar

Quando se pensa em Marcelo D2, logo vem à cabeça o músico que não tem medo de experimentar e que ajudou a promover uma reformulação do rock nacional, com suas pitadas de rap e samba. Foi assim em seu primeiro disco solo, em 2003, um casamento de samba e hip hop.

“Eu sou fruto de uma geração que cresceu ouvindo Josephine Baker, James Brown e Cartola. Eu cresci ouvindo rap americano e samba em casa, onde a música sempre foi presente. Mas foi o hip hop que me deu voz, me fez levantar a autoestima e me trouxe para rodar o mundo”, conta.  

“Quando eu lancei ‘À Procura da Batida Perfeita’, eu sempre falava que a procura é muito mais importante do que a batida perfeita. O meu legado como artista é a procura. É levantar todos os dias e tentar fazer algo novo. Escrever e ser polêmico, esse é o lugar onde eu me sinto mais confortável”, conclui 

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