O novo capítulo da crise política brasileira deixou os países vizinhos em alerta. De todos eles, a Argentina é a que mais corre riscos por ser o país mais integrado com o Brasil e o que mais depende da economia brasileira. O pior que poderia acontecer para a Argentina, que começa a se recuperar da recessão, é que o Brasil volte a cair. Para o governo argentino, seria péssimo que esse impacto aconteça em um ano eleitoral. Essa é a opinião do próprio presidente Mauricio Macri e dos analistas ouvidos pelo correspondente em Buenos Aires
Márcio Resende, correspondente da RFI na Argentina
Preocupação é a palavra usada por todos os membros do governo argentino para definir a tensa expectativa com o desenrolar da crise no Brasil. O presidente Mauricio Macri disse que vê a situação com preocupação, mas, ao mesmo tempo, diz confiar nas instituições brasileiras para encontrar uma saída. Ele declarou também esperar que o Brasil saia fortalecido desse processo. Ele deseja que a crise seja superada o mais rápido possível porque a Argentina precisa de um Brasil forte.
A chanceler Susana Malcorra afirmou que o governo acompanha a situação de perto que e deseja uma solução "rápida". A ministra admitiu que a crise brasileira pode afetar a economia argentina.
Impactos concretos
Assim como o Brasil, a Argentina está saindo de uma recessão econômica e tem muita expectativa em uma retomada do crescimento brasileiro para consolidar seu próprio desenvolvimento. Brasília é o principal cliente da Argentina, comprando mais da metade dos produtos industrializados, que são os que mais geram empregos.
A previsão argentina é de um crescimento econômico de 3% neste ano. Mas essa projeção pode diminuir se o Brasil arrastar o país para baixo.
E as consequências podem ser também políticas. Em outubro, haverá eleições legislativas, cruciais para o governo Macri ampliar a base governista no Congresso não só para poder aprovar suas reformas, mas também para poder ter chances de uma reeleição daqui a dois anos. E um contexto econômico favorável é o melhor cabo-eleitoral.
Crise pode impedir reformas do governo Temer
Entrevistado pela RFI, o economista Dante Sica, um dos responsáveis argentinos na relação com o Brasil e consultor do governo, estima que o problema não é só a crise brasileira abortar a recuperação econômica que se insinuava. O problema, segundo ele, é que, sem as reformas impulsionadas pelo governo Temer, o Brasil não volta a crescer de forma sustentável.
A Argentina entrou em estado de alerta com a possibilidade de o Brasil ter, pelo terceiro ano consecutivo, uma retração econômica e não conseguir aprovar as bases para voltar a acelerar. O cálculo é o seguinte: para cada ponto de crescimento no Brasil, a Argentina cresce automaticamente 0,25%. O Brasil encolheu quase 8% nos últimos dois anos, fazendo a economia argentina diminuir 2 pontos.
Efeitos invisíveis
Fora isso, existem os efeitos invisíveis da crise brasileira, aqueles que não podem ser medidos, ressalta Marcelo Elizondo, outro economista que segue de perto a situação brasileira e que é consultado pelo governo, também entrevistado pela reportagem
Para que o plano econômico argentino dê certo são necessários investimentos maciços. O governo tem feito um grande esforço para abrir mercados e mostrar que o país está inserido internacionalmente. Mas os investidores externos, quando investem na Argentina, não olham necessariamente só para o mercado nacional, mas sim para o mercado ampliado da Argentina, que é o Brasil.
Por exemplo, desde que o presidente Mauricio Macri assumiu há 17 meses, já foram anunciados US$ 61 bilhões em investimentos, mas a maior parte desses investimentos ainda não foi concretizada. Os investidores esperam para saber se Macri vai poder avançar com suas reformas e qual será o potencial de crescimento do país. O desempenho da economia brasileira é fundamental para essas respostas.
Além do mais, com a crise no Brasil, as empresas brasileiras têm urgências domésticas e dificuldades de investir fora do país. E para onde ia boa parte dos investimentos brasileiros? Para a Argentina.
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