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Hungria

Protesto contra lei "escravagista" de Viktor Orbán marca 1° de Maio na Hungria

Os trabalhadores húngaros não costumam sair às ruas em manifestações no 1° de Maio, data que evoca lembranças desagradáveis do período da ocupação soviética e do regime comunista (1945-1989) no pós-guerra. No entanto, nesta quarta-feira, centenas de húngaros atenderam à convocação da Aliança dos Sindicatos da Hungria (Vosz) e fizeram uma marcha até a praça dos Heróis, em Budapeste, para protestar contra medidas trabalhistas adotadas pelo primeiro-ministro nacionalista ultraconservador Viktor Orbán.

Trabalhadores carregam faixa por mais direitos sociais na manifestação do 1° de maio em Budapeste.
Trabalhadores carregam faixa por mais direitos sociais na manifestação do 1° de maio em Budapeste. Foto: RFI
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Adriana Moysés, enviada especial à Budapeste

A data era especial e ajudou na mobilização. Hoje, os húngaros também celebram o 15° aniversário da adesão da Hungria à União Europeia. “A mensagem que queremos transmitir é que exigimos mais direitos sociais para os trabalhadores e melhores salários”, explicou o líder da Vosz, Tamás Székely.

A Hungria vive uma situação paradoxal em relação ao seu mercado de trabalho. A taxa de desemprego em janeiro de 2019 foi de apenas 3,5%, ou seja, o país vive uma situação de pleno emprego, mas os salários são baixos, inclusive em comparação aos vizinhos da Polônia e da República Tcheca, e falta mão de obra qualificada na indústria.

O salário mínimo húngaro continua um dos mais baixos da Europa Central, mesmo depois de subir em janeiro para $ 149.000 forints, o equivalente a € 464,20. Além disso, como o combate à imigração é o principal posicionamento ideológico de Orbán contra a Comissão Europeia em Bruxelas, o país tem deixado entrar trabalhadores vindos da Ucrânia, Mongólia e Azerbaijão sem declará-los oficialmente, segundo ONGs.

Essa tensão no mercado de trabalho húngaro piorou em dezembro, quando o governo aprovou uma lei – considerada “escravagista” pelos sindicatos – que aumentou de 250 para 400 horas por ano o número de horas extras que empresas públicas e privadas podem exigir dos assalariados. A lei autorizou os empregadores a pagarem as horas extras num prazo de três anos e ainda de acordo com um método de cálculo desfavorável aos trabalhadores.

Aumentar o volume de horas adicionais foi a solução encontrada pelo premiê, avesso à imigração, para enfrentar a escassez de mao de obra provocada por um recuo contínuo da natalidade e a emigração de jovens para países com salários mais altos no bloco. Revoltados, os trabalhadores se uniram a partidos de oposição no fim do ano e fizeram uma série de protestos para denunciar a deriva autoritária do governo. A mobilização se estendeu a cobranças para resgatar a independência da imprensa e da justiça, colocadas sob a tutela do Fidesz, o partido de Orbán.

Solidariedade entre gerações

A aposentada Gyorgyi, 62 anos, presente na manifestação de 1° de Maio na praça dos Heróis, disse que estava na rua para expressar seu desacordo com a nova lei das horas extras. “Estou aqui por solidariedade aos outros trabalhadores e aos membros da minha família que ainda trabalham e recebem baixos salários”, explicou a aposentada. “O governo aumentou recentemente o salário mínimo, mas o problema é que alguém que trabalha há 30 anos ganha o mesmo que um jovem que está começando agora, o que coloca os trabalhadores uns contra os outros”, acrescenta Gyorgyi. “Era preciso aumentar progressivamente todos os salários, não apenas o valor de referência do mínimo”, analisa.

Zoltan, 55 anos, esteve na marcha como representante de um Sindicato de Policiais. Segundo ele, os maiores problemas enfrentados pela categoria são os baixos salários e a reforma que acabou com a aposentadoria antecipada para policiais, agentes penitenciários, agentes aduaneiros e bombeiros.

O contador Gyula, 36 anos, trabalhava até pouco tempo atrás como contador na IBM, mas perdeu seu emprego por causa de sua atuação como sindicalista. Ele estima que a “lavagem cerebral” promovida por Orbán serviu para empresas multinacionais, que respeitam a ação sindical em outros países do bloco, se sentirem à vontade para explorar os trabalhadores na Hungria. O contador recebeu os três meses de seguro desemprego a que tinha direito, mas ainda não encontrou um novo emprego por ser discriminado pelo militantismo sindical.

A manifestação dos trabalhadores húngaros contou com a presença de sindicalistas europeus, como o francês Thiébaut Weber, delegado da Confederação Sindical Europeia Trade Union (CES – ETUC), uma entidade que representa 40 milhões de trabalhadores na Europa, e Jan-Willem Goudriaan, secretário-geral da EPSU, de Bruxelas, central do funcionalismo público europeu. As vésperas das eleições para o Parlamento Europeu, de 23 a 26 de maio, as confederações do bloco defendem a criação de um mínimo europeu para acabar com as discriminações salariais no interior do bloco.

Weber, da ETUC, iniciou seu discurso parabenizando os trabalhadores da Venezuela, que lutam, segundo ele, pela defesa da democracia no país sul-americano. O francês disse, na sequência, que a lei “escravagista” editada pelo governo Orbán era “intolerável”. Na prática, diante dos protestos de dezembro, as empresas do oeste europeu que instalaram fábricas na Hungria para beneficiar da mão de obra barata decidiram aguardar um tempo antes de aplicar a legislação. O recuo parece, no entanto, temporário.

O líder da Vosz, Tamás Székely, enfatizou que não é contra a presença de imigrantes no mercado húngaro, desde que a atividade dos estrangeiros seja corretamente regulamentada.

Thiébaut Weber, da Confederação Sindical Europeia Trade Union, entidade que representa 40 milhões de trabalhadores na Europa, discursa em manifestação dos trabalhadores na Hungria.
Thiébaut Weber, da Confederação Sindical Europeia Trade Union, entidade que representa 40 milhões de trabalhadores na Europa, discursa em manifestação dos trabalhadores na Hungria. Foto: RFI

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