Sem lágrimas, lepenistas comemoram melhor resultado da extrema-direita na História da França
Nada de choro nem vela. Aliados e convidados de Marine Le Pen preferiram dançar ao som de antigos sucessos na noite deste 7 de maio no salão principal do Chalet du Lac, na região leste de Paris, após o anúncio da derrota de sua candidata na eleição presidencial. Levando rosas azuis [símbolo da campanha de Marine] artificiais na lapela, em braceletes ou nas mãos, o "grand monde" da extrema-direita lavou suas mágoas à francesa: muito champagne, salto agulha e broches "Marine" pisca-pisca, entre uma ou outra Marselhesa [hino francês] puxada no meio do salão. Com 11 milhões de votos, eles celebram 34,5% da preferência dos franceses e um resultado histórico para a extrema-direita na França.
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“Um general não conta seu plano de batalha nem entrega o contingente total de seus soldados”, responde o chefe da segurança do partido de extrema-direta Frente Nacional (FN), quando perguntado quantos policiais haviam sido deslocados para garantir a segurança no Chalet du Lac, antiga mansão de Napoleão 3°, perto da floresta de Vincennes, no leste de Paris, local escolhido pelo partido de extrema-direita para sediar sua noite eleitoral do segundo turno da eleição presidencial francesa de 2017.
A obsessão com Napoleão não é uma prerrogativa lepenista, no entanto. O Museu do Louvre, escolhido pelo novo presidente da França, Emmanuel Macron, para realizar seu discurso da vitória, também neste 7 de maio de 2017, foi o antigo palácio de Napoleão 1° e de Napoleão 3°. Mas se o tom do “general” lepenista parecia antecipar uma noite cheia de anacronismos e saudações à bandeira, a juventude francesa presente impressiona pela adesão às ideias muitas vezes consideradas reacionárias do partido fundado por Jean-Marie Le Pen, pai de Marine, na década de 70.
Hugo, 22 anos, estudante de História da Arte na Sorbonne, em Paris, é um dos jovens franceses que apoiam Marine Le Pen. “Eu acompanho Marine de maneira ativa há três meses. Mas eu sempre apoiei o partido Frente Nacional nas poucas eleições em que já participei”, explica. “Escolhi o partido FN, porque também estudei Direito e isso me abriu os olhos para o funcionamento da Europa. Hoje todas as medidas que são preconizadas para recolocar a França nos trilhos são pensadas a partir da União Europeia. Hoje não podemos ajudar nossos compatriotas de maneira significativa e ativa porque estamos submetidos ao bloco. Enxerguei no partido Frente Nacional a possibilidade de recuperar nossa soberania nacional. Não posso esconder minha decepção com a derrota desta noite, Macron conseguiu um bom score, 65%. Por outro lado, isso nos conforta também: conseguimos seduzir 35% do eleitorado”, finaliza Hugo.
Champagne, salto agulha e muita polícia
A Frente Nacional organizou um esquema de alta segurança para receber imprensa e convidados, que incluiu portas de detecção de metal e revista individual por policiais. Desde a chegada à avenida de Bel Air, a alameda já se encontrava bloqueada por dezenas de viaturas da polícia nacional francesa, e duplas de soldados patrulhavam o perímetro com metralhadoras. O policiamente era ostensivo, depois de uma campanha marcada por ameaças e ataques como o da Avenida Champs Elysée, nas vésperas do primeiro turno.
A americana Katherine, freira da Igreja Cristã Ortodoxa, levava um grosso crucifixo de madeira rústica dependurado no pescoço delicado, envolto pelos trajes religiosos, e destoava do visual “tea party” festivo da noite. Levada pelo amigo, segurança do local, a freira, de 24 anos, confessou ser admiradora de longo tempo das ideias defendidas por Marine Le Pen. “Ela não é racista, nem antissemita”, afirma Katherine. “São interesses práticos, sempre voltados para o bem-estar de seu povo”, acredita. “Se eu fosse francesa e votasse aqui, com certeza votaria nela, mais do que em Macron ou nos outros. Estou decepcionada com o resultado desta noite, mas é necessário aceitar a vontade de Deus também”, declarou a freira americana, numa pista surrealmente lotada por jovens dançarinos com rosas azuis na lapela.
E nas pick-ups, nada tão católico assim: de Madonna a Serge Gainsbourg, de Claude François a Abba, a pista ferveu na noite do partido de extrema-direita no Chalet do Lago, com direito a muita champagne, vinho e um buffet dentro da tradição francesa de frios, queijos e doces. A aparição de Marine Le Pen após o anúncio de sua derrota foi fulgurante e direto ao ponto: “somos a nova e verdadeira oposição da França. Agradeço aos 11 milhões de franceses que depositaram sua confiança em mim, somos a França do futuro”, declarou, antes de sair intempestivamente, como uma verdadeira diva, pela porta giratória do "Chalet". Seus aliados, no salão principal, entoaram a Marselhesa duas vezes, antes de engatar um “Merci, merci, Marine” (“obrigado, obrigado, Marine”).
A França “no coração”
A bela Manon, de 24 anos, estudante de História na Sorbonne, era uma das militantes mais disputadas para entrevistas pelos canais de televisão presentes no local. Ágil e decidida, ela explica com desenvoltura seu apoio a Marine Le Pen: “Participo desta militância há dois anos, porque tenho a França no meu coração. Como muitos franceses, sabe, nós somos patriotas, soberanistas, e eu tenho muita vontade de lutar por uma coisa nova, por reencontrar um orgulho nacional. Na verdade estou muito orgulhosa desta campanha da candidata”, avalia.
“Bom, nós perdemos esta noite, é a lei da democracia”, consola-se Manon. “É deste jeito, nós aceitamos o resultado das urnas. Mas estou feliz de ter combatido ao lado de Marine Le Pen. Foi minha primeira eleição presidencial a seu lado. Foram momentos maravilhosos, estou muito feliz, não tenho nenhum arrependimento”, afirma a estudante francesa.
E o racismo, a xenofobia, como ficam na cabeça dos jovens que apoiam a Frente Nacional? “Não somos racistas, é totalmente exagerado, uma fixação isso. Nós somos anti-comunitaristas, é o inverso mesmo do racismo, consideramos que o importante é sermos franceses, não importa a raça, a cor da pele, a religião, nada disso. Hoje a França é ameaçada por esta fragmentação. Houve uma tal falta de assimilação na escola que as pessoas que possuem origens estrangeiras são cada vez menos franceses. Isso nós combatemos. Nossa luta é o inverso do racismo, é considerar que qualquer um, não importa a cor da pele, a religião ou a ideologia possa ser francês”, finaliza a estudante, enquanto os últimos acordes de I Will Survive, hit de Gloria Gaynor, invadem a pista, e velhos e novos personagens da extrema-direita mais-que-francesa arrastam seus novos velhos pares para dançar.
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