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Consentimento sexual

França reage à idade mínima de 15 anos para “consentimento sexual”: presunção de culpa?

Apesar da comemoração de Marlène Schiappa, secretária de Estado da Igualdade entre Homens e Mulheres da França, e do coro das associações em defesa dos Direitos da Mulher, que apoiam a determinação da idade legal de 15 anos como “apta a consentir com um ato sexual”, o Sindicato de Juízes advertiu o governo francês nesta terça-feira (6) contra a possibilidade de "condenações automáticas", em caso de relação sexual entre uma pessoa maior de idade e um (a) menor de 15 anos.

Na França, ao contrário do resto da Europa, ainda não havia uma idade mínima para o consentimento sexual.
Na França, ao contrário do resto da Europa, ainda não havia uma idade mínima para o consentimento sexual. Pixabay
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No universo pós-escândalo sexual do ex-todo-poderoso Harvey Weinstein, nada parece ser como antes no quartel de Abrantes. A quantidade de denúncias de assédio e violência sexuais explodiu em todo o planeta, alertando de maneira global o que algumas mulheres condenavam individualmente: a cultura do abuso, tema da redação do Enem em 2015, no Brasil.

Os resultados dessa debâcle histórica são vistos também na França, onde, para além das manifestações [femininas e feministas], como a vista na última cerimônia do César (o Oscar francês), o próprio governo resolveu tomar as rédeas da situação, definindo a idade mínima legal de 15 anos para o “consentimento sexual”, no contexto de um projeto de lei contra violências sexuais e sexistas.

Mas o que seria isso, na era da paquera consumada em cinco minutos na Internet? Segundo a lei francesa, trata-se da autorização – voluntária, livre e lúcida – que um parceiro concede a outro antes de um ato sexual. Para os franceses, essa decisão só poderia ser tomada, a partir de agora, a partir de 15 anos de idade, um número que surgiu após semanas de debates intensos: o presidente francês Emmanuel Macron se declarou a favor de 15 anos; já o procurador-geral de Paris, François Molins, sugeria 13 anos. Na dúvida, o governo se inclinou para a primeira hipótese, segundo o anúncio feito por Marlène Schiappa na segunda-feira (5).

Mas, para Virginie Duval, presidente do Sindicato dos Juízes da França, o tiro poderá sair pela culatra, ganhando status de “presunção de culpa automática”. "Não seria então uma questão de consentimento. O fato de ter relações sexuais com alguém com menos de 15 anos se tornaria um estupro. Isso seria muito problemático porque é uma presunção de culpa", afirmou nesta terça-feira.

"Se um jovem de 18 anos faz sexo com uma garota de 14 anos e 11 meses, ele terá que ser enviado de volta ao tribunal, condenado e preso por 30 anos; e ele não poderá dizer: “ok, nós nos amamos, houve consentimento”, explicou Duval.

O governo francês não esclareceu segunda-feira se a presunção de não consentimento seria irrefutável, isto é, não aceitaria de forma alguma prova em contrário, como teria sido evocado. No caso de uma simples suspeita de culpa, no entanto, a lei francesa permite que a defesa possa provar que o menor estava consentindo no momento da relação sexual.

Três semanas de debate intensivo

Segundo Martine Brousse, presidente da associação A Voz da Criança, e autora do relatório utilizado pelo governo francês para definir a idade mínima de 15 anos, “esse debate se ampliou com os dois casos de meninas de 11 anos que foram estupradas. Para a primeira, o ato havia sido qualificado como agressão. No caso da segunda garota, o acusado foi liberado pelo júri. Isso criou uma forte polêmica e o governo começou a investigar se nossa legislação protegia menores contra o estupro”, disse, durante entrevista à RFI.

Na França, ao contrário do resto da Europa, ainda não havia uma idade mínima para o consentimento sexual. “Acredito que já sabíamos o tamanho deste problema, mas descobrimos de repente que certos juízes não levavam em conta a idade, a vulnerabilidade da criança, e tinham como única referência o texto legal, esquecendo completamente que uma criança de 11 anos é antes de tudo uma criatura sem defesa, que não sabe exatamente o que vai se passar”, argumenta Brousse.

“Nestas três semanas, a missão multidisciplinar do governo fez uma intensa pesquisa, lemos estudos, fizemos uma audição com um neurocientista, escutamos vários outros médicos, pedopsiquiatras. Focamos na proteção ao menor e, sobretudo, na fragilidade da construção do cérebro de uma criança ou adolescente. O cérebro humano se constrói até a idade de 16 anos, e em alguns casos, até 25 anos. Optamos por proteger as crianças e adolescentes de atos de violência sexual”, conclui.

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