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Cannes/Weinstein

Depois do Oscar sem Weinstein, agora é a vez de Cannes sem Weinstein

Pela primeira vez depois de muitos anos, o produtor americano Harvey Weinstein não estará em Cannes para promover seus filmes, organizar e participar de festas e assediar mulheres. Mas a imagem do elefante branco, quebrando tudo pelo caminho na loja de porcelana ainda está no ar.

Weinstein, o ex-todo poderoso do cinema mundial.
Weinstein, o ex-todo poderoso do cinema mundial. REUTERS/Mike Blake
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Para o jornal britânico The Guardian, Cannes é cena de crime, playground onde Weinstein circulava impunemente. A revista semanal M, do jornal Le Monde, diz que "Cannes criou o todo-poderoso Weinstein" e também traz um minucioso relato de como o produtor americano impunha sua personalidade nos negócios, nas relações com empregados, nas festas, reuniões e as pressões que fazia quando tinha um filme em competição em Cannes.

Weinstein era um distribuidor de faro, ele havia criado com seu irmão mais novo, Bob, a Miramax. Os filmes que eles distribuíam viravam ouro: Meu Pé Esquerdo, Sexo, mentiras e videotape, além de obras assinadas por Claude Lelouch, Pedro Almodovar, Peter Greenway, Krzysztof Kieslowski, Bernardo Bertolucci e Jane Campion. Em 1989, ele já tinha pressionado o festival a passar Meu Pé Esquerdo, de Jim Sheridan, com Daniel Day-Lewis, mas sem sucesso, apesar dos múltiplos telefonemas para Gilles Jacob, então diretor-geral do festival.

“Minha relação com ele sempre foi horrível. Harvey olhava para você com a intenção de intimidar. Mas ele tinha uma falha. A de pensar que era Deus”, disse Gilles Jacob à revista M.

Weinstein ganhou a coroa de reizinho mandão de Cannes em 1994, quando produziu Pulp Fiction, dirigido por Quentin Tarantino. O filme, com John Travolta, Uma Thurman, Bruce Wyllis e Maria de Medeiros levou a Palma de Ouro. Depois disso, o produtor virou sinônimo de ostentação e poder em Cannes.

Artimanha

Nesse ano em que Pulp Fiction era candidato, conta a revista M, Weinstein armou um longo almoço entre Tarantino e Janet Maslin, chefe do setor de críticas do New York Times, em Cannes. O produtor pressentiu que a jornalista iria gostar do filme. Dito e feito, ela escreve uma matéria altamente elogiosa do banho de sangue de Pulp Fiction. Weistein desliza um exemplar do jornal sob a porta de cada integrante do júri, que ainda vai deliberar sobre os filmes. Os exemplares reaparecem na mesa onde os integrantes se reúnem, mas o presidente do júri, o ator-diretor Clint Eastwood, pede que os jornais sumam da mesa. Três filmes estão no páreo da Palma: Pulp Fiction, Viver!, do chinês Zhang Yimou e Sol Enganador, do russo Nikita Mikhalkov.

O rei perde a coroa

O mundo do cinema foi testemunha silenciosa dos mandos e desmandos de Weinstein até que em outubro passado, primeiro o New York Times e, alguns dias depois, o New Yorker, escancararam a brutalidade e a falta de escrúpulos do patrão da Miramax. Ele até tentou comprar o silêncio de muitas pessoas e contra-atacar na justiça, mas a degringolada aos infernos foi rápida, abandonado pela família e demitido da própria empresa.

Na onda das denúncias, grandes nomes deram nomes ao boi. Uma Thurman foi uma das primeiras a detalhar as táticas grotescas do produtor, de receber a pessoa vestido apenas com um robe, pedir massagem e tentar o ato sexual. A atriz Asia Argento, de 42 anos, alega que foi violentada aos 21 anos por Weinstein no luxuoso hotel Cap-Eden-Roc, em Antibes, não muito longe do burburinho de Cannes.

Sexismo ainda vigora

O Guardian também se pergunta se o festival francês aprendeu alguma coisa com isso tudo. Apesar de ter instaurado uma linha telefônica de denúncias, o jornal observa que o sexismo continua em voga na Riviera Francesa. O dinamarquês Lars von Trier, acusado de assédio pela atriz e música Bjork, foi convidado este ano a exibir seu último filme, The House that Jack Built, fora de competição. Em 2011, von Trier foi considerado ‘persona non grata’ pelo festival, depois de ter expressado simpatia a Hitler durante uma entrevista coletiva.

O jornal inglês lembra também no ano passado, antes do movimento #MeToo, apenas diretoras estavam na corrida: Sofia Coppola, Lynne Ramsay and Naomi Kawase. Doze meses depois e um furacão Weinstein no caminho, mais uma vez somente três mulheres vão subir as escadarias de Cannes por uma Palma de Ouro em 2018: Nadine Labaki, Eva Husson and Alice Rohrwacher. Vale a pena ressaltar também que em 70 anos de festival, apenas uma mulher, a australiana Jane Campion, levou o prêmio, em 1994, por O Piano.

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