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Esporte em foco

Morte de jovem jogador de rúgbi reacende o debate sobre comoções cerebrais na França

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A prática do rúgbi está se tornando cada vez mais violenta e preocupa as autoridades do esporte na França. A morte de Louis Fajfrowski, jovem jogador de apenas 21 anos, no último fim de semana em Aurillac, no sul do país, relançou o debate sobre a falta de medidas mais eficientes para proteger os atletas.

Árbitro ajuda jogador do ASM Clermont Auvergne com suspeita de concussão cerebral durante partida do Campeonato Europeu de Rugby contra os Northampton Saints, outubro de 2017
Árbitro ajuda jogador do ASM Clermont Auvergne com suspeita de concussão cerebral durante partida do Campeonato Europeu de Rugby contra os Northampton Saints, outubro de 2017 THIERRY ZOCCOLAN / AFP
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Raphael Ibañez, de 45 anos, e Jean-Pierre Rives, de 65, são exemplos de ex-jogadores profissionais que tiveram que encurtar a carreira por causa de repetidas comoções cerebrais. Mas os jovens atletas também sofrem com as pancadas.

A comoção ou concussão cerebral é uma lesão que afeta todas as áreas do cérebro e que altera temporariamente as funções normais, como memória, concentração ou equilíbrio, por exemplo. Na maioria das vezes, os sintomas desaparecem. Mas quando esse tipo de trauma acontece com frequência, as lesões podem se tornar irreversíveis.

Maxime Villalongue, promessa do clube Stade Français, precisou parar após vários choques. Apesar de não apresentar nenhuma sequela visível, o francês, de 25 anos, parado há quase um ano, ainda apresenta problemas de dicção. "As pessoas que não me conhecem e que me veem hoje poderiam pensar que estou bem, mas ao falar comigo percebem que ainda é algo difícil para mim. Ainda não estou 100% e há muito trabalho de reeducação pela frente", reconhece o jovem atleta.

O presidente do sindicato dos jogadores de rúgbi, Robin Tchalé Watchou é outro que precisou abandonar o esporte prematuramente. Ele afirmou que até hoje não consegue fazer certos movimentos básicos e chega a ficar com a vista embaçada. "É nessas horas que me pergunto se um dia terei uma vida normal. Se poderei voltar pra casa, ver meus filhos e viver normalmente”, concluiu.

Rugby Feminino

O problema também preocupa a categoria feminina do esporte. A ex-capitã da seleção francesa Marie-Alice Yahé abandonou o esporte após vários desmaios. Ela contou que em uma das vezes que passou mal, não entendeu o motivo. ”A bola bateu em minha cabeça, algo comum nos esportes, que acontece até com crianças”, disse a jogadora. Yahé foi então informada pelos médicos que em pessoas que sofreram muitas comoções, basta uma pequena batida na cabeça para voltar a sofrer os sintomas da concussão.

O problema, segundo o ex-jogador canadense Jamie Cudmore, é que no rúgbi profissional, a adrenalina e a vontade de conquistar títulos fazem os jogadores deixar a saúde em segundo plano. Ele conta que durante uma partida, quis voltar ao jogo de qualquer maneira, mesmo após diversos golpes na cabeça. “Eu estava muito empolgado para voltar a campo. Era uma final, em um grande estádio. Tinha entrado para ganhar e não pensava na minha saúde. Voltei à partida até o apito final, mas após esse jogo foram 3 meses muito difíceis”, admite o ex-atleta.

Saúde em segundo plano

O ex-jogador e vice-presidente da Federação Francesa de Rugby, Serge Simon, lembra que houve uma época em que as concussões eram tratadas de forma banal. “Lembro que muitas vezes, quando eu desmaiava, via uma imagem de mar, sempre depois de um golpe violento. Era algo que durava alguns segundos e na sequência o treinador chegava, colocava uma esponja cheia de água sobre minha cabeça e dizia que eu já estava pronto pra outra.

Apesar da crescente preocupação, os clubes acabam ignorando os conselhos dos próprios médicos. Adrien Buononato, ex-jogador do Clermont e atual técnico do Clube Oyonnax, reconhece que muitas vezes a saúde dos atletas fica em segundo plano. “Se um jogador fica meio zonzo, pedimos ao médico para que autorize a volta a campo de qualquer maneira. Focamos só na partida, e por isso, esquecemos de proteger nossos atletas”, admitiu.

Para combater a falta de atitude dos clubes, algumas medidas foram tomadas. Em 2012, a federação criou o “protocolo comoção”, pedindo aos árbitros que registrassem as concussões durante a partida e fizessem com que o jogador atingido não voltasse a campo.

Após a medida, 102 comoções foram contabilizadas no campeonato profissional e mais de 1.800 nos torneios amadores. Este ano, multas que chegam a €50 mil começaram a ser aplicadas contra os clubes que desrespeitam o protocolo.

Exame de sangue

Muitos diretores esportivos alegam a dificuldade em perceber quando um atleta sofreu de fato uma comoção. Para facilitar o diagnóstico, o professor e neurocirurgião Jean-Didier Chazal, após anos de pesquisa, conseguiu criar um teste de sangue que comprova se houve ou não comoção. “Encontramos um marcador no sangue que aumenta após um traumatismo craniano. Decidimos então usar esse teste diagnóstico, biológico, para ter argumentos que atestem uma comoção cerebral. Percebemos que após uma concussão, a taxa desse indicador no sangue aumentava fortemente. Nós analisamos o sangue no início da temporada e voltamos a fazer o teste após uma suspeita de comoção cerebral”, explicou o médico. “Com esse teste, mesmo se um jogador afirmar que está bem, podemos dizer “não, você sofreu uma comoção cerebral”, concluiu.

Com choques cada vez mais violentos, muitos pais já não colocam mais os filhos no esporte. A cinco anos para a Copa do Mundo de Rúgbi na França, o país, que tem hoje 272 mil jogadores federados, já conta com mais de 16 mil atletas a menos, comparando com os números de 2016.

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