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Radar econômico

"Inteligência artificial vai mais criar do que destruir empregos no século XXI", diz especialista

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Uma das questões mais debatidas atualmente é como as novas tecnologias, incluindo a robótica e a inteligência artificial, poderão impactar no mercado de trabalho e nas relações profissionais.

Quem são os robôs que vão substituir ou acompanhar os humanos num futuro talvez próximo?
Quem são os robôs que vão substituir ou acompanhar os humanos num futuro talvez próximo? Pixabay
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Para o advogado e pesquisador Ronaldo Lemos, ainda estamos longe das cenas de filmes de ficção científica. Porém, não há dúvidas de que as mudanças estão a caminho.

"Quando a gente vê essas questões sobre inteligência artificial, em geral o que a gente pensa é naquelas imagens de filmes de ficção cientifica onde vão haver robôs que vão se revoltar contra os seres humanos e vão, inclusive, matar e guerrear contra a gente. Mas isso, na verdade, é uma bobagem. Eu não acho que esse é o problema. O problema é justamente a desigualdade. Uma das razões para isso é que a relação entre capital e trabalho vai se tornar muito desigual. O capital vai conseguir exercer o trabalho por si só, de forma automatizada, e o espaço que nós seres humanos vamos ter para desempenhar serviços e sermos remunerados por isso vai ser cada vez menor."

"Se você olhar economias desenvolvidas como os Estados Unidos, hoje você não tem nenhum sinal de que isso está acontecendo, ao contrário, os Estados Unidos estão com pleno emprego, e o preço dos salários está subindo e não diminuindo. Então do ponto de vista econômico isso é muito claro que não tem nenhum robô ali substituindo gente, não tem ninguém desempregado topando trabalhar por menos", completa Ronaldo Lemos.

Porém, diante de um futuro de mudanças e incertezas, as próprias empresas de tecnologia estudam novas formas de remuneração. 

"A ideia do trabalho, de que todos trabalham pode ser colocada em risco. Então tem debates muito interessantes sobre a criação de uma renda básica universal. Isso está sendo discutido inclusive pelas empresas do Vale do Silício, de que todo mundo deva ter uma renda mínima que dê conta da sua subsistência e alguma coisa a mais para que você possa viver a sua vida, como se os dividendos dessa economia nova pudessem ser distribuídos para todos", explica o advogado.

Preocupação com inteligência artificial não é nova

Autor do best-seller A Guerra das Inteligências, o francês Laurent Alexandre explica que esse não é um fenômeno novo. E mostra porque a sociedade não precisa temer a evolução tecnológica.

"Quando os ferreiros desapareceram progressivamente com a chegada dos carros, há cem anos, as pessoas não imaginavam que no século XXI criaríamos empregos de programadores de informática, cinegrafistas para a televisão, pilotos de aviões, cirurgiões, fabricantes de microprocessadores. Hoje vemos com inquietação os empregos que vão desaparecer, e não vemos ainda a incrível quantidade de profissões que vão aparecer nos próximos cem anos. Na realidade, vamos criar mais empregos do que a inteligência artificial vai destruir ao longo do século XXI. Não devemos nos inquietar por nossos filhos, eles terão trabalho, por séculos e séculos."

Um estudo divulgado durante o Fórum Econômico Mundial em Tianjian, na China, em setembro, estima que a automação e a robótica criarão, até 2025, 58 milhões de empregos. O número é resultado de uma conta que prevê a supressão de 75 milhões de postos de trabalho em áreas como serviços postais, secretariado e de embalagens; enquanto outros 133 milhões de novos empregos deverão aparecer graças à evolução digital. O levantamento foi feito com 300 empresas multinacionais presentes em 20 países, que reúnem hoje mais de 15 milhões de empregados.

Um dos palestrantes mais requisitados da França quando o assunto é a sociedade do futuro, Laurent Alexandre não acredita no fim do trabalho.

"Eu não acredito na morte do trabalho. Você sabe que os imperadores romanos tinham medo que as máquinas destruíssem o trabalho em Roma há dois mil anos. É um medo que sempre tivemos porque as pessoas veem a destruição dos postos de trabalho, mas não veem as profissões do futuro. Ninguém na época do Napoleão poderia imaginar que haveria os aviões e microprocessadores. Eu não sou otimista, eu sou realista. A tecnologia vai criar oportunidades extraordinárias para as gerações que virão."

Natureza das mudanças

A principal diferença agora está na natureza das mudanças. Segundo o coordenador do mestrado em ciências digitais da SciencePo, em Paris, Benoît Thieulin, até hoje sempre que havia transformações profundas elas atingiam a parte baixa da pirâmide, onde estão os trabalhadores menos qualificados, enquanto a onda da digitalização e da robótica afetará o alto escalão.

"A primeira onda de robotização dos anos 1970 e 1980 atingiu inicialmente os operários. E esse movimento continua, especialmente no mundo industrial, pois ainda não temos empregados domésticos robôs, mesmo que isso venha a acontecer no futuro, muito provavelmente. Mas a nova onda, atualmente, que é essa da inteligência artificial, atinge os chamados empregos de colarinho branco. As enfermeiras estão menos ameaçadas, por exemplo, do que os médicos. São as profissões de análise que podem ser automatizadas. Entre um radiologista e um computador, que terá acesso a milhares de imagens para poder comparar um osso a milhares de outros, é evidente que a análise digital será incomparável com aquilo que o radiologista poderá fazer unicamente com os olhos e o cérebro. Então haverá um reposicionamento, sobretudo nos trabalhos qualificados, daquilo que poderá ser feito pelas máquinas, e a parte humana, de responsabilidade, que continuará sendo feita por pessoas."

Por outro lado, diante de um cenário de maior desigualdade de forças, existe o risco do surgimento de uma espécie de proletariado da economia digital, como explica Ronaldo Ramos.

"Uma tarefa nova que vai surgir vai ser a pessoa ficar classificando informações para fins de inteligência artificial. Vai ter empregos, por exemplo, em que a pessoa fica olhando fotos o dia todo e dizendo se aquilo é uma casa, é um carro, se é uma montanha, e assim por diante. Então por um período esse tipo de trabalho, que é um proletariado cognitivo, vai começar a surgir sim e vai ser importante. Em algum momento esse processo de automação vai vir e vai vir com força. Pode levar vinte anos, mas vai ter um momento em que haverá carro autônomo, máquina que se auto-opera, entregas de mercadorias todas automáticas, então isso vai acontecer, mas não acho que é imediato".

Até lá, a recomendação para os trabalhadores é que continuem a se aperfeiçoar e não tenham medo de reaprender, como aconselha Benoît Thieulin.

"As pessoas vão reaprender muitas coisas que aprenderam na escola e a ideia de uma formação continuada vai se tornar uma realidade."

 

 

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