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Reportagem

Prisão de manifestantes no Brasil fere direito internacional

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A prisão de manifestantes suspeitos de planejarem protestos violentos no último dia da Copa do Mundo no Brasil fere o direito internacional, na opinião de especialistas. A Federação Internacional das Ligas dos Direitos Humanos, uma das principais organizações do mundo de defesa dos direitos fundamentais, observa que o papel das autoridades não é prender organizadores de manifestações, mas sim garantir que a violência não “contamine” os atos.

Protesto no Rio de Janeiro no dia do final da Copa, em 13 de Julho.
Protesto no Rio de Janeiro no dia do final da Copa, em 13 de Julho. REUTERS/Nacho Doce (BRAZIL
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Em decorrência de ações preventivas para evitar tumultos durante o Mundial, duas pessoas suspeitas de cometerem atos de violência continuam presas em São Paulo e cinco no Rio de Janeiro, inclusive Elisa Zanzi, a Sininho, apontada como a articuladora do grupo. No Rio, 18 ativistas são considerados foragidos.

A FIDH, com sede em Paris, destaca que o direito à manifestação é reconhecido pelo artigo 20 da Declaração Internacional de Direitos Humanos. As restrições aos protestos são previstas quando existem elementos que indiquem uma grave ameaça à ordem pública, mas esses casos são raros, destaca Antoine Madelin, porta-voz internacional da federação.

“O direito internacional não prevê a restrição das liberdades em manifestação. O que existe é a proibição da autorização de uma manifestação, que não tem como consequência a privação da liberdade de ir e vir ou o risco de ser preso”, argumenta. “Eu acho que é preciso haver muito mais razões para que uma pessoa seja detida. É preciso que ela seja uma verdadeira ameaça à ordem pública, um verdadeiro perigo. Se a pessoa apenas convoca uma manifestação, isso não constitui uma verdadeira razão para uma prisão.”

Polêmica na França

Como no Brasil, a polêmica sobre o cerceamento do direito de manifestar também acontece neste momento na França, onde dois protestos a favor dos palestinos foram proibidos pelas autoridades francesas. A Liga Francesa de Direitos Humanos condena a medida e afirma que a proibição acaba incitando à violência. Pierre Tartakowsky, presidente da entidade, lembra que, na França, a prisão de manifestantes antes da realização dos atos só ocorreu em relação ao grupo extremista basco ETA.

“A França não tem o costume de fazer prisões preventivas, mas já fez, raramente, em casos de manifestações. Ela já cerceou, de maneira preventiva, redes separatistas bascas, ou seja, um meio no qual a ação política está próxima de ações militares ilegais. E não eram propriamente casos de manifestações, mas sim com o pretexto de garantir a segurança máxima de autoridades que visitariam a região”, recorda-se. “Nós sempre condenamos profundamente essas prisões preventivas, porque achamos que se trata de uma mecânica de direito extremamente perigosa. Quando começamos a prender as pessoas não pelo que elas fizeram, mas pelo que elas podem fazer, entramos em uma situação jurídica muito instável e extremamente liberticida.”

Prisões ilegais

O advogado Breno Melaragno Costa, professor de Direito Penal da PUC-Rio, avalia que os responsáveis por crimes durante protestos devem responder criminalmente. Mas aponta que no caso dos manifestantes detidos antes da Copa, houve arbitrariedades, como a decretação das prisões temporárias com o objetivo de evitar vandalismo no final da Copa e a restrição do acesso dos advogados de defesa aos autos do processo.

“Eu penso que o juiz desvirtuou a razão de ser da prisão temporária. Não há como prender alguém supondo que ele vai cometer um crime. Isso é uma afronta às leis, às normas jurídicas vigentes”, afirma. “São prisões ilegais, tanto é que o Tribunal de Justiça, em segunda instância, assim decidiu e determinou a soltura dos presos.”

Antoine Madelin ressalta que a violação do direito de protestar tem aumentado em todo o mundo. Alguns países, relata, chegam a mudar a legislação para autorizar a prisão de manifestantes.

“O relato do Brasil ecoa o que temos visto no mundo inteiro hoje, infelizmente. Assim como no Brasil, a mesma coisa acontece na Turquia ou em outros países, onde as autoridades restringem de maneira abusiva as liberdades de reunião e de manifestação e cometem, neste aspecto, violações das suas obrigações internacionais em direitos humanos”, lamenta.

Garantir segurança

O representante da Federação Internacional das Ligas dos Direitos Humanos argumenta que as autoridades precisam tomar as medidas necessárias para garantir que os protestos ocorram sem violência, como delimitar o trajeto da manifestação e estar em contato com os organizadores dos atos. A proibição, garante, deve sempre ser a última alternativa para evitar o quebra-quebra.
 

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