Acessar o conteúdo principal
O Mundo Agora

Tendência dos partidos europeus é fragmentação perigosa

Publicado em:

Uma eleição após outra na Europa vem confirmar uma tendência inquietadora: a crescente fragmentação dos partidos políticos e o enraizamento de movimentos populistas, tanto de esquerda quanto de direita.   

O partido minoritário Podemos tornou-se a terceira força política da Andaluzia.
O partido minoritário Podemos tornou-se a terceira força política da Andaluzia. REUTERS/Jon Nazca
Publicidade

Na França, as eleições locais mostraram claramente que a tradicional alternância entre esquerda e direita de governo está se transformando em tri-partidarismo. A Frente Nacional – xenófoba, racista e anti-europeia – não alcançou o seu objetivo de surgir como o primeiro partido do país; mas com 25% dos votos, o partido de extrema-direita conseguiu se implantar seriamente a nível dos distritos e dos municípios. As conseqüências para a política nacional serão significativas e perigosas.

Na Espanha, as eleições regionais na Andaluzia mostraram, também pela primeira vez, que o novo partido dos “indignados” da esquerda radical, o Podemos, pode ser bom de voto. Esse movimento, aliado do partido da extrema-esquerda grega Syrisa – que conquistou o poder em Atenas –, ficou em terceiro lugar, depois dos dois grandes partidos tradicionais da esquerda e da direita espanholas. A Espanha começa a temer que o Podemos acabe se tornando um “fazedor de reis” na política nacional, impedindo qualquer governabilidade.

Mas essa lenta implosão do cenário político europeu não para por aí. Basta lembrar os partidos autonomistas na Catalunha, na Escócia, na Bélgica ou na Itália. Ou os movimentos da ultra-direita nacionalista na Inglaterra, na Alemanha, na Holanda, na Grécia e até nas velhas e consolidadas democracias escandinavas. Pior ainda, essa extrema-direita populista europeia não esconde a sua admiração pelo presidente russo, Vladimir Putin, e seu regime nacional-autoritário. Um namoro que o Kremlin usa e abusa abertamente, com financiamentos e apoios, para enfraquecer os governos e as forças políticas tradicionais da Europa ocidental.

Até há pouco tempo, os europeus haviam escapado desse processo de desagregação política, que também existe em outras partes do mundo. O pior exemplo é o mundo árabe, onde a fragmentação chegou a tal ponto que vários Estados nacionais desapareceram em meio a guerras civis.

Na América Latina, boa parte das oposições e da situação está tão fracionada que os governos não têm mais capacidade de resolver os problemas que vêm se acumulando e que não há perspectiva de que a oposição seja melhor. Os quase trinta partidos presentes no Congresso brasileiro podem servir para estudo de caso dessa deterioração política. Até no poderoso Estados Unidos, o Congresso se dividiu de forma tão extrema, e minorias radicais adquiriram tanta força, que a política nacional está paralisada e até a política externa americana tornou-se refém do saco de gatos onde brigam grupos democratas e republicanos cada vez mais despedaçados. Até na China, o partido comunista que monopoliza o poder está começando a se fraturar, com brigas internas de foice no escuro sob pretexto de luta contra a corrupção.

Na verdade, essa tendência quase universal à desagregação política e à radicalização das forças partidárias é só mais uma etapa da perda de poder das autoridades nacionais. Hoje, com a globalização da economia, dos processos produtivos, das finanças e das informações e referências culturais, os dirigentes políticos nacionais não têm mais capacidade de resolver os problemas sociais e econômicos das populações. E sabem muito bem disso. Só que as populações também tomaram consciência da impotência de seus representantes políticos. Perdendo poder a cada dia, os políticos não atraem mais elementos honestos e competentes Aos que escolhem a carreira política só sobram o cinismo e a corrupção. “Mateus primeiro os teus”. Quanto aos cidadãos, com forte poder de informação e mobilização própria graças às redes sociais, eles tentam se virar sem os políticos, tomando iniciativas locais. Ou então eles são atraídos pelo canto das sereias populistas e extremistas que prometem resolver tudo de uma vez na porrada e com soluções milagrosas que sempre acabam mal.

A política “como no antigamente” perdeu qualquer espaço. Hoje temos que inventar as novas formas políticas capazes de administrar o nosso mundo globalizado. Mas com o caos aumentando dia a dia, não está nada garantido de que isso possa acontecer sem guerras, violências e mais tragédias humanas.

 

* Alfredo Valladão é cientista político e professor do Instituto de Estudos Políticos de Paris
 

NewsletterReceba a newsletter diária RFI: noticiários, reportagens, entrevistas, análises, perfis, emissões, programas.

Acompanhe todas as notícias internacionais baixando o aplicativo da RFI

Veja outros episódios
Página não encontrada

O conteúdo ao qual você tenta acessar não existe ou não está mais disponível.