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Reportagem do Libération sobre Cracolândia revela incoerências das políticas públicas

O jornal Libération publica nesta quarta-feira (20) uma extensa reportagem sobre a Cracolândia, em São Paulo. O diário francês conta o histórico dos usuários de crack na cidade, a explosão do consumo nos últimos anos, que faz do Brasil o maior consumidor de crack do mundo, e as políticas incoerentes de governos sucessivos, que não conseguiram debelar o consumo da droga. A repressão policial, praticada com frequência contra os usuários de crack, também está longe de resolver o problema.

Imagem do centro de São Paulo ilustra a reportagem sobre a Cracolândia na edição de quarta-feira (20) do Libération.
Imagem do centro de São Paulo ilustra a reportagem sobre a Cracolândia na edição de quarta-feira (20) do Libération. Libération
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O Libération teve o cuidado de ouvir todas as partes envolvidas na problemática: os moradores da Cracolândia, associações que tentam dar apoio aos dependentes, médicos, urbanistas e o poder público. O jornal deixa claro que, conforme o governo, de esquerda ou de direita, o resultado das tentativas de esvaziar a Cracolândia é praticamente o mesmo: um fracasso.

O texto mostra que já se tentou um pouco de tudo na Cracolândia: repressão, hospitalização forçada de usuários e reinserção social. Porém, o número de viciados está sempre em alta porque, por trás do consumo de drogas, existem seres humanos com problemas múltiplos e complexos que não dá para resolver num passe de mágica, nota a autora da reportagem, Chantal Rayes.

O atual prefeito de São Paulo, o petista Fernando Haddad, o governador Geraldo Alckmin e os prefeitos precedentes, adeptos da repressão truculenta contra "nóias" da Cracolândia, são todos criticados. O padre Julio Lancellotti, da Pastoral da População de Rua, relata que policiais municipais que patrulham a área confiscam tudo o que pode servir para esconder a droga, até os cobertores dos viciados. Segundo Lancellotti, o poder público quer expulsar das ruas os usuários de crack, mas essas pessoas não têm para onde ir. "Quem iria imaginar uma tal política vindo da esquerda", lamenta o religioso.

Os programas de saúde pública adotados até o momento não conseguiram debelar o tráfico e o consumo na Cracolândia, gerando polêmica entre os especialistas.

Programas públicos têm alcance limitado

O psiquiatra Dartiu Xavier, do programa De Braços Abertos, criado por Haddad, explica que a primeira coisa que se tenta oferecer aos usuários de crack são três refeições por dia, um teto e, se possível, um trabalho. Para alguns dependentes, isso é suficiente para que eles abandonem o crack por conta própria. Salvo em casos extremos, o psiquiatra recomenda a hospitalização, que envolveu 44% dos consumidores no ano passado. No entanto, ao final do programa de desintoxicação, a maioria volta para a droga. "Nossos hospitais e comunidades terapêuticas são verdadeiras prisões, onde os pacientes são submetidos a tortura psicológica", reclama o médico.

Já Ronaldo Laranjeira, responsável pelo programa Recomeço, de hospitalização forçada, criado pelo governador Geraldo Alckmin, ataca a abordagem da prefeitura petista dizendo que o programa De Braços Abertos coloca traficantes e usuários na mesma categoria e sob o mesmo teto, o que, em sua opinião, alimenta a existência da Cracolândia.

Incompatibilidade cultural com programas europeus

Libération questiona se a Cracolândia um dia vai desaparecer do centro de São Paulo.

A França vai experimentar em breve as salas monitoradas por agentes de saúde para os usuários de heroína, outra droga dificíl de combater. O governo francês acabou adotando a experiência depois que outros países europeus registraram bons resultados com essa prática e o recuo do consumo de drogas pesadas. Por isso, o Libération questiona se não seria uma solução aplicável aos usuários de crack no Brasil.

O jornalista Bruno Paes Manso, especialista na Cracolândia, diz que o prefeito de São Paulo não tem coragem de tomar uma medida como esta. Outras pessoas ouvidas na reportagem também descartam a ideia, alegando que ela não faz parte da cultura brasileira. Libération conclui que a Cracolândia está longe de acabar.

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