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Brasil-Mundo

Thiago Soares, primeiro bailarino do Royal Ballet de Londres, é tema de documentário

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Quem acompanha de perto a trajetória dos grandes bailarinos internacionais raramente tem a oportunidade de enxergar o ser humano por trás dos múltiplos personagens que são capazes de incorporar. Mas o documentário “Primeiro Bailarino”, de Felipe Braga, oferece aos fãs de balé um novo olhar sobre o brasileiro Thiago Soares. É como se o público pudesse espiar esse grande artista   que há 12 anos se destaca como primeiro bailarino no prestigiado Royal Ballet de Londres   pelo buraco da fechadura do camarim.

O bailarino Thiago Soares
O bailarino Thiago Soares Andrej uspensky
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Dividido em seis capítulos, o filme teve uma pré-estreia no Regent Street Cinema, estabelecimento emblemático de Londres, que abriu as portas em 1848, e é considerado o berço do cinema britânico. A série também será exibida no Royal Opera House, em janeiro de 2019, mas já pode ser assistida pela HBO.

“Foi uma experiência muito bonita. Eu vejo um monte de defeitos, de coisa errada. Eu tenho aquele olhar crítico. Mas eu fico feliz em ter um recorte tão honesto de um momento muito importante da minha carreira”, disse Soares diz em entrevista à RFI.

Presença da dor

Como se a câmera não estivesse ali, Thiago vai descortinando a rotina em Londres e os preparativos para as apresentações que fez no Brasil para festejar seus 15 anos de carreira, em 2016. Ele se aborrece com as falhas da organização dos espetáculos brasileiros.

O bailarino também descreve a relação de muitos anos com a dor e insiste na sua presença constante. “A dor passa a ser a sua amiguinha”, desabafa no filme. Ao público, admite que a maneira de enfrentar a dor muda com a idade. Em diversos momentos durante o documentário, o espectador se depara com a estrela que não cansa de se perguntar se tudo aquilo vale à pena, enquanto tenta amenizar o sofrimento do corpo com sacos de gelo, alongamento ou sessões de fisioterapia.

Os relatos vão sendo feitos um pouco em português, um pouco em inglês, os dois canais que modulam o dia-a-dia desse artista do mundo. Nascido e criado no bairro de classe média baixa de Vila Isabel, no Rio de Janeiro, onde tinha uma vida simples, pulava roleta de ônibus e dançava hip hop na rua, foi parar no Teatro Municipal do Rio. Foi premiado em Moscou e Paris, até desembarcar no Royal Ballet.

A ideia do documentário não foi dele. Já tinha sido abordado anos antes para o projeto de um filme em que se contaria a história do famoso casal de primeiros-bailarinos do Royal Ballet, ele e a argentina Marianela Nuñez. Mas com a separação do casal, a ideia acabou perdendo o sentido. O filme de Braga, que já tinha realizado um documentário sobre Neymar, foi feito em um momento conturbado da vida de Thiago, quando se separava, saía de casa e montava os espetáculos no Brasil.

Preocupação de se manter brasileiro

Não há depoimentos de parentes ou amigos sobre o protagonista. O foco está em Thiago. Não por que ele quisesse assim. O bailarino garante não ter tido qualquer ingerência sobre a maneira com a sua história seria contada. A ideia é mostrá-lo apenas, deixar que o espectador tire as suas conclusões, sem a interferência dos olhares de terceiros.

Ao longo da carreira, Thiago procurou manter-se brasileiro, sem jamais perder a identidade e foi muito criticado por isso. Ele diz que muitos bailarinos tentar se encaixar numa companhia importante e acabam assumindo outras identidades, misturando-se ao novo ambiente. Mas é assim que considera ter um diferencial.

Em conversa com a RFI, depois do lançamento do filme, Thiago reconhece que o mundo do balé é competitivo como poucos. Um dia o artista é celebrado, no outro está nos jornais, e no terceiro dia já foi esquecido. Tudo isso foi potencializado na era da internet e das mídias digitais. Garante que tem de “matar um leão por dia”, mas se considera uma pessoa realizada.

“É muito importante a gente manter a identidade. Mesmo indo para fora, eu sempre quis manter as minhas raízes. Fazer a minha arte, me sentindo íntegro às minhas raízes, me faz mais feliz. Às vezes, você paga um preço por isso. Mas parte do meu diferencial sempre foi isso. E sempre preguei isso e prego, porque acho importante a gente ser quem a gente é de verdade, e poder fazer nossa arte. Ser um artista latino-americano, brasileiro, mas dançar pelo mundo afora”, afirma.

E vai mais longe: “Deveríamos investir na nossa identidade, na nossa escola, nos nossos desejos, na maneira que a gente se comunica. Não há nada de errado nisso. Russos, franceses, italianos e ingleses fazem isso, e, ao mesmo tempo, dão espaço aos artistas internacionais, de protagonismo, sem que percam a sua identidade. Acho que a gente deveria investir um pouco nisso”

Evasivo sobre política

Modelo para muitos brasileiros, Thiago evita falar de política. Mas, em entrevista à RFI, não deixa de analisar o momento atual do país. Diz que o Brasil está muito dividido e vai precisar de um tempo para se recuperar dos traumas recentes. Ele defende que cada um tem de fazer a sua parte da melhor maneira possível, por um sentido maior. Sobre o futuro da cultura e dança no país, diz que o Brasil tem bons artistas e coreógrafos. Mas destaca que a cultura não pode ser vista como um diminutivo Deve ser prioridade, como acontece em países como o Reino Unido e a Alemanha. Segundo ele, deve ser atribuída à cultura a mesma importância que se dá à educação e à saúde. Até porque a indústria criativa é uma das que mais cresce pelo mundo e cria novos potenciais econômicos para os seus países.

“O Brasil tem bons bailarinos, coreógrafos, e companhias. O que precisa é ter mais apoio. A dança, às vezes, é vista um pouco no diminutivo. A dança, sem dúvida, deve receber mais apoio e um olhar com mais carinho para essa carreira é tão curta e tão dinâmica, que influencia tantas vidas”, relata.

O filme está na HBO do Brasil e outros países da América Latina. A distribuição no Reino Unido ainda está em negociação. Vale lembrar que está em produção um longa-metragem inspirado na vida de Thiago, que será interpretado pelo ator Matheus Abreu. O filme, que tem a direção de Marcos Schechtman, deve estrear no final do ano que vem.

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