Princesa da Tailândia provoca terremoto político ao disputar cargo de primeira-ministra
A inesperada candidatura da princesa Ubolratana Rajakanya às eleições legislativas de 24 de março causou um terremoto político nesta sexta-feira (8) na Tailândia. Irmã do rei em exercício, ela vai disputar o cargo de primeira-ministra, abrindo um novo cenário no país controlado com mão de ferro por militares. Nenhum membro da família real se candidatou à função de chefe de governo desde que o país se tornou uma monarquia constitucional, em 1932.
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Oficialmente, a família real da Tailândia não se envolve com política, mas Ubolratana Rajakanya, de 67 anos, é célebre no país por sua excentricidade. Atriz e cantora, a princesa se casou com um americano, razão pela qual perdeu seu título real. Mas, depois de se divorciar, retornou ao país de origem, onde passou a protagonizar campanhas antidrogas ou aparecer fantasiada em vídeos irreverentes.
A princesa "é nossa candidata ao posto de primeira-ministra" nas eleições, anunciou Preechaphol Pongpanich, dirigente do partido Thai Raksa Chart. A legenda é a mesma do bilionário e ex-premiê no exílio Thaksin Shinawatra - odiado pelo exército, mas muito popular entre a população de baixa renda.
Reformista, Shinawatra sempre foi visto pela velha Guarda Real e pelos militares como uma ameaça à monarquia. A situação motivou dois golpes de Estado militares contra seus governos, em 2006 e 2014.
Sinal de ruptura
Desde o último golpe militar, liderado por generais próximos ao rei Bhumibol Adulyadej, o monarca faleceu e foi substituído por seu filho Maha Vajiralongkorn. A candidatura da irmã do rei - que segundo os analistas não poderia ter sido decidida sem a aprovação do palácio - é, portanto, um sinal de ruptura sem precedentes com a velha guarda da época Bhumibol.
A cientista política Eugénie Mérieau, especialista em Tailândia da Sciences-Po de Paris, é otimista quanto à eleição de Ubolratana Rajakanya. "É uma princesa amada pelo povo, que canta, que vai ao mercado, aparece comendo pratos populares, então, acredito que ela pode ganhar. Até o momento, ela tem o apoio da maioria dos partidos e dos pró-militares. Com isso, ela tem certeza de conseguir trazer uma maioria para a Câmara Baixa, ser eleita primeira-ministra e de formar um governo de coalizão, chamando os candidatos dos partidos que a apoiaram como primeira-ministra", avalia.
Principal adversário da princesa
Após o anúncio da princesa, o comandante da junta que governa o país, Prayut Chan-O-Cha, também anunciou que disputará o cargo, em uma tentativa dos militares de manter sua influência, quatro anos após o golpe.
"Decidi aceitar o convite do Phalang Pracharat de apresentar meu nome ao Parlamento para ser nomeado primeiro-ministro", disse Prayut, em referência ao partido pró-militar fundado em 2018.
Prayut Chan-o-Cha lidera a junta militar há quase cinco anos. O regime aprovou uma nova Constituição para redefinir o panorama político e garantir que os militares controlem o poder após as eleições.
Sob o comando de Prayut, os militares se apresentaram como os protetores da monarquia. Mas, a entrada de Ubolratana no cenário político, com o apoio de um adversário da junta, contradiz a ideia.
Simples plebeia
"É algo inédito. Se ela virar primeira-ministra, o povo poderá tratá-la como simples plebeia? Quem se atreveria a criticar uma primeira-ministra da realeza?", questiona Puangthong Pawakapan, professora de Ciência Política na Universidade Chulalongkorn, de Bangcoc.
De fato, a família real na Tailândia é protegida por uma lei draconiana para impedir qualquer reclamação contra os monarcas. Legalmente, as irmãs do rei não são cobertas por esta lei, mas ninguém se atreve a criticá-las por medo da possibilidade de ser condenado a uma pena de prisão de vários anos.
Já para Vajiralongkorn, a eleição da princesa é cômoda, garantindo o domínio de uma mesma família nas duas instâncias de poder. Outro que pode se beneficiar da vitória de Ubolratana é Shinawatra que, amigo da princesa, espera obter uma graça real e voltar à Tailândia.
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