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Linha Direta

Em meio à tensão entre Irã e EUA, americanos se opõem a mais uma guerra

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A ordem de retirada parcial dos diplomatas americanos no Iraque, anunciada na quarta-feira (16), foi inesperada, apesar de o relacionamento entre os EUA e o Irã ser bastante salgado. Em resposta, Teerã acusou nesta quinta-feira (17) o governo americano de provocar uma "escalada inaceitável". A inimizade dos dois países nunca foi um segredo, mas desde a saída unilateral dos EUA do acordo nuclear iraniano, em maio de 2018, a tensão só tem aumentado.

O presidente Donald Trump Trump, pessoalmente, não parece ter interesse em guerra com o Iraque. Ele, inclusive, foi sempre publicamente contra a guerra do Iraque.
O presidente Donald Trump Trump, pessoalmente, não parece ter interesse em guerra com o Iraque. Ele, inclusive, foi sempre publicamente contra a guerra do Iraque. Alex Wong/Getty Images/AFP
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Ligia Hougland, correspondente da RFI em Washington

Na semana passada, devido à desaprovação dos Estados Unidos quanto ao comportamento confrontador do governo do presidente iraniano Hassan Rohani, que admitiu a retomada parcial de seu programa nuclear, Donald Trump anunciou mais sanções ao setor de mineração do país asiático, representando cerca de 10% das suas exportações. Logo depois, Teerã anunciou que deixaria de aplicar alguns compromissos do acordo para seu programa nuclear.

Para complicar ainda mais a situação, depois de, no fim de semana passado, os EUA terem despachado ao Oriente Médio navios de guerra e bombardeiros, dois petroleiros da Arábia Saudita, uma embarcação dos Emirados Árabes Unidos e um navio da Noruega sofreram ataques de sabotagem no Golfo Pérsico. Até agora, ninguém assumiu responsabilidade por esses ataques, mas representantes do governo americano declaram à imprensa, sob anonimato, que acreditam que os ataques foram realizados por milícias xiitas ou rebeldes houthis do Iêmen, incentivados pelo Irã. Esses grupos armados, simpatizantes do Irã, têm forte presença no Iraque, levando o governo americano a dar a ordem de retirada de seus diplomatas.

Americanos não querem mais conflito

Os americanos, sem dúvida, não querem saber de mais guerra no Oriente Médio. Para eles, é muito gasto humano e financeiro em lugares do mundo considerados distantes, em todos os sentidos. Esse foi, inclusive, um dos motivos de Trump ter atraído eleitores, baseado num discurso de teor mais isolacionista que chegou a agradar uma parte da população que tem simpatia pela ideologia libertária, contrária à intervenção em conflitos internacionais. Essa linha é também adotada por uma das pré-candidatas democratas à presidência, a deputada Tulsi Gabbard, do Havaí.

Além disso, muitos dos americanos ainda não se conformaram com a guerra do Iraque, que começou em 2003, durante o governo de George W. Bush, e durou quase uma década – um conflito que para muitos não foi justificado. É comum se dizer que Washington “gosta de guerra”, pois geram muito dinheiro para o complexo industrial militar e também empregam em think tanks muitos políticos e funcionários de alto escalão aposentados. No entanto, agora o Congresso está sendo bastante cauteloso, e mesmo os senadores republicanos estão dizendo que não vão aprovar uma briga sem antes terem provas bem concretas para isso. Afinal, muitos políticos até hoje são criticados por terem apoiado a guerra no Iraque, apesar de as alegadas armas de destruição em massa, que foram usadas como justificativa na época, nunca terem sido encontradas nem confirmadas.

Contexto complexo

Muitos integrantes do governo americano dizem que há ameaças iminentes aos Estados Unidos, mas até agora nada foi confirmado – e é justamente isso que os membros do Congresso estão exigindo da Casa Branca.  Na terça-feira (14), o general britânico Chris Ghika disse que a coalizão militar liderada pelos EUA, que combate o grupo Estado Islâmico, não havia detectado nenhuma maior ameaça iraniana ou de forças respaldas pelo Irã.

O Comando Central dos EUA discorda dessa avaliação e diz que os serviços de inteligência americanos e seus aliados identificaram ameaças na região. Outro motivo para muitos estarem reticentes quanto à gravidade e à iminência de tais ameaças é o fato de John Bolton, personagem com fama de belicoso e que foi um dos grandes promotores da guerra do Iraque, quando atuava no governo de Bush, agora ser o assessor de segurança nacional de Trump. Nos últimos dias, a imprensa americana divulgou relatos de que há uma divisão dentro do governo de Trump sobre o aumento da tensão com o Irã e alguns temem a influência de Bolton. Trump logo declarou pelo Twitter que não há rixa interna, apenas uma troca de ideias, e que somente ele tomará a decisão final.

O presidente americano parece não ter interesse em guerra e, inclusive, foi sempre publicamente contra o conflito no Iraque. Mas Trump, e muitos em Washington, sem dúvida gostariam de ver uma mudança de regime que impedisse que o Irã continuasse sendo o que consideram uma força desestabilizadora na região. Trump também deixa claro que quer acabar de vez com o programa nuclear iraniano e colocar um fim em qualquer possibilidade de o país produzir armas desse tipo.

Hesamoddin Ashena, assessor do presidente iraniano, diz que não vão se deixar intimidar pelos EUA e que, se Trump ouvir Bolton, “vai ter guerra”. Já o aiatolá Ali Khamenei, que é quem manda no país, diz que nenhum dos lados está interessado em conflito. Do lado americano, apesar da fama de belicoso, Bolton conhece bem como se faz política externa, pois já foi embaixador dos EUA na ONU, e pode apenas também estar fazendo o papel de “policial durão”.

Trump, por sua vez, diz que espera que o Irã comece a dialogar com os EUA para chegar a um acordo em breve. No entanto, com tantas personalidades voláteis e interesses sobrepostos, inclusive envolvendo jogadores de peso no cenário geopolítico internacional, como Rússia, China e Turquia, a situação é complexa e pode tomar rumos inesperados.

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