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Saúde

Luta contra alimentos ultra processados é destaque em simpósio da FAO

Ao mesmo tempo que obesidade aumenta no mundo, cresce também a desnutrição. A alimentação do futuro e a agricultura devem percorrer o caminho da sustentabilidade, produzindo alimentos saudáveis, seguros e nutritivos para todos. Estes são os principais temas tratados pela FAO no simpósio de dois dias intitulado "O futuro dos alimentos" ("The future of food"), que começou nesta segunda-feira (10) em Roma.

Alimentos ultra processados, além de causar dependência, podem estimular a voracidade de consumo.
Alimentos ultra processados, além de causar dependência, podem estimular a voracidade de consumo. REUTERS/Pilar Olivares/File Photo
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Gina Marques, correspondente da RFI em Roma

O objetivo do encontro é avaliar a situação nutricional do mundo e combater a subnutrição presente em alguns países, lutando contra a obesidade e as doenças não transmissíveis ligadas à dieta. Na abertura do evento, o diretor geral da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), José Graziano da Silva, ressaltou a preocupação com a saúde humana junto com a saúde do planeta.

"Para produzir alimentos saudáveis e garantir alimentos saudáveis para todos, devemos começar com solos saudáveis, sementes saudáveis e práticas agrícolas sustentáveis. É todo o sistema alimentar que deve ser redirecionado", disse o brasileiro.

O diretor destacou ainda os problemas da sociedade contemporânea e desperdício alimentar. Segundo ele, é necessário que prevaleça a nutrição, mas para isso não é preciso aumentar a quantidade de alimentos produzidos, e sim priorizar a produção de alimentos de qualidade.

Graziano da Silva acrescentou que “nem sempre os alimentos inócuos são saudáveis”, porque passam por processamentos industriais usando aditivos que podem causar doenças não transmissíveis como diabete e câncer. “Precisamos incrementar as políticas fiscais dos alimentos, com rótulos mais claros, restrições na publicidade” observou.

Em muitos casos a obesidade e a má nutrição caminham juntas. Na semana passada em Brasília, a ONU realizou uma conferência entre países das Américas para definir os próximos passos para o enfrentamento da epidemia de obesidade infantil. Os estudos apresentados mostraram que o número de obesos com idade entre cinco e 19 anos cresceu mais de dez vezes no mundo, de 11 milhões em 1975 para 124 milhões em 2016.

Relação entre alimentos ultra processados e obesidade

O simpósio foi organizado com a participação de pesquisadores, nutricionistas e especialistas agrícolas, de vários países, entre eles o brasileiro Carlos Monteiro, professor de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. Junto com uma equipe especializada em nutrição e saúde, ele elaborou em 2009 um estudo sobre o processamento dos alimentos e a influência na qualidade final da dieta. Este estudo é chamado de classificação NOVA.

“Você pode processar os alimentos de várias formas. Pode ser muito positivo como aumentar a duração dos alimentos, mas pode ser também muito negativo quando se utilizam os alimentos como matéria-prima para fazer substitutos dos alimentos, que chamamos de alimentos ultra processados” disse o professor a RFIBrasil.

A classificação NOVA divide todos os tipos de alimentos em quatro grupos. O primeiro é o mais saudável, com alimentos minimamente processados ou não que não sofreram nenhum tipo de processamento. Já o último grupo se refere aos ultra processados. O professor Monteiro explicou que nos últimos cinco anos a classificação NOVA foi usada em pesquisas em vários países na Europa, nos Estados Unidos, Canadá, Japão e outros.

Alimentos ultra processados podem causar dependência

“ Os estudos demonstram que quanto mais o alimento é processado, menor é a qualidade nutricional. Além disso, aumentam os riscos de várias doenças, como logicamente a obesidade, mas também diabete, hipertensão, doenças cardiovasculares, vários tipos de câncer e a mortalidade geral por todas estas causas” observou.

O ultra processamento dos alimentos muitas vezes está diretamente ligado à ganância comercial. As indústrias acrescentam aditivos, colorantes, intensificadores de sabor, alteram a textura, sendo que alguns provocam dependência física no consumidor.

Segundo o professor Monteiro, as indústrias ultra processam os alimentos por duas razões, reduzir o custo e aumentar o consumo: “Quando se faz um alimento combinando proteínas, carboidratos e gorduras de baixo custo, como soja, amido de milho, reduz-se o preço final do produto porque o custo da matéria-prima é mais barato. Outro aspecto é que com os aditivos, a indústria tem a possibilidade de manipular a sensação de prazer e satisfação que as pessoas têm comendo, até mesmo a dependência” explicou.

Situação brasileira

Os estudos mostram que nos Estados Unidos, por exemplo, os alimentos ultra processados, além de causar dependência, podem também estimular a voracidade de consumo, fazendo com que a pessoa queira comer cada vez mais.

Segundo o professor, os brasileiros ainda têm esperança de evitar a prevalência do consumo de comida ultra processada e conter o aumento da obesidade da população. “O Brasil está numa situação intermediária, tanto na obesidade como no consumo de alimentos ultra processados. Isso nos dá uma chance muito grande de agir em tempo. Em países como os Estados Unidos ou mesmo Reino Unido, os alimentos ultra processados dominam a dieta e fazer com que as pessoas voltem a consumir comida de verdade, preparando os alimentos, é mais difícil”.

Conheça a classificação NOVA

NOVA é a classificação que categoriza os alimentos de acordo com a extensão e o propósito de seu processamento. Esta catalogação identifica todos os alimentos e produtos alimentícios em quatro grupos claramente distintos:

1º grupo – Alimentos in natura ou minimamente processados: arroz, feijão, hortaliças, frutas, leite pasteurizado, carne congelada ou fresca, ovos, batata, mandioca, etc. Esse grupo é formado por alimentos que saem da natureza e recebem ou não algum tipo de processamento como secagem e moagem.

2º grupo – Alimentos que contenham ingredientes culinários processados: gorduras (óleo, azeite, manteiga), sal, azeite e vinagre, que são substâncias retiradas de alguns alimentos ou da natureza (sal) e são utilizados para temperar, preparar e cozinhar os alimentos do primeiro grupo.

3º grupo – Alimentos processados: Produção industrial que combina ingredientes do primeiro grupo com o do segundo. Por exemplo, utilizando o leite do primeiro grupo, com o sal do segundo grupo, produz-se o queijo. Dentre outros exemplos de alimentos do 3º grupo também foram citados o pão e a geleia de frutas.

4º grupo – Alimentos ultra processados: Trata-se de uma invenção da tecnologia alimentar e, segundo o pesquisador Carlos Monteiro, não têm nada a ver com os outros grupos, pois não tem como base um alimento.

Os alimentos ultra processados são formulações de amido, gorduras, sal, açúcar e proteínas extraídas de alguns outros alimentos, como da soja por exemplo, e muito aditivos (corantes, texturizantes e aromatizantes). São produtos de baixo custo, mas os aditivos fazem com que se tornem alimentos palatáveis ou até mesmo hiperpalatáveis (saborosos, agradáveis ao paladar). Ou seja, são produtos apreciados devido à cor, textura e sabor, que são acrescentados artificialmente pelas indústrias para atrair as pessoas, mas que possuem pouquíssimo alimento integral.

 

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