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Vitória de Lula é alento para sociedade civil, mas eleições mostram que bolsonarismo continua forte

Luiz Inácio Lula da Silva venceu as eleições brasileiras e voltará a ocupar a cadeira de presidente do Brasil a partir de 1º de janeiro de 2023, doze anos depois de deixar o posto. Na eleição mais apertada da história, com um país dividido, o petista superou Jair Bolsonaro com uma frente ampla de apoio, muito além dos tradicionais aliados mais à esquerda, a começar pelo vice, o ex-tucano e ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSB). Também integraram essa multipartidária rede de apoio nomes como Simone Tebet (MDB), Marina Silva (Rede) e Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

Eleitores do presidente eleito Lula (PT) celebram sua vitória, em Brasília, em 30 de outubro de 2022.
Eleitores do presidente eleito Lula (PT) celebram sua vitória, em Brasília, em 30 de outubro de 2022. AFP - SERGIO LIMA
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Raquel Miura, correspondente da RFI em Brasília

“Foi um resultado mais apertado do que projetavam as pesquisas. E há sim temores de que  Bolsonaro não aceite a derrota. Mas também é bom frisar que essa vitória representa um alento não só a esses milhões de eleitores, mas também a vários setores da sociedade civil, como o mercado financeiro e a mídia. Então acho que Bolsonaro terá margem pequena para se mover nessa tentativa golpista”, disse à RFI o cientista político Cláudio André de Souza, doutor em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia.

“Além disso ele não encontra aderência a esse tipo de contestação no cenário internacional. Não tem apoio de líderes mundiais nem da China, nem da Rússia, nem dos Estados Unidos, além, claro da União Europeia”, completou o analista.

Lula venceu com discurso de que a vida do brasileiro voltaria a ser melhor, com avanço nas condições de emprego e renda. Também afirmou que irá recolocar o Brasil num lugar de destaque nas negociações internacionais e trabalhar para reunificar o país. O petista foi de branco votar neste domingo, enquanto Bolsonaro preferiu usar as cores características de seus apoiadores, o amarelo da seleção brasileira.

O Nordeste mais uma vez foi decisivo para a vitória do petista. Lula perdeu nas regiões Sul, Sudeste e Centro-oeste, porém a votação dele no Nordeste foi tão expressiva que superou a diferença em outras áreas. Em estados populoso, como São Paulo e Rio de Janeiro, Bolsonaro venceu, mas a diferença não ultrapassou a vantagem do petista.

Bolsonaro é o primeiro presidente que não consegue se reeleger desde a aprovação da emenda que permite que o chefe do Executivo dispute um segundo mandato consecutivo. Ele foi eleito em 2018 com um discurso de extrema direita, focado na família, na religião, na defesa do armamento da população e se apresentando como um outsider da política, com um arsenal de informações divulgadas pelas redes sociais.

Apuração

A onda bolsonarista perdeu as eleições deste ano, mas mostrou que continua forte na sociedade brasileira, tão pequena foi a diferença entre os dois candidatos: pouco mais de dois milhões de votos.

A partir das 17h a aflição parecia de final de copa do mundo, mas com um país dividido. A apuração começou com Jair Bolsonaro à frente, mas uma hora e 45 minutos depois ele foi ultrapassado por Lula, que manteve a liderança.

Em alguns estados termômetros da disputa nacional, como Minas Gerais, Lula só passou Bolsonaro depois das 19h30. Com isso se manteve a tradição eleitoral brasileira: nunca houve uma virada do primeiro para o segundo turno e nenhum candidato venceu a eleição presidencial sem conquistar Minas.

O PT de Lula venceu também na Bahia, onde Jerônimo Rodrigues acabou ficando na frente de ACM Neto (DEM). Mas em São Paulo, o candidato petista Fernando Haddad foi derrotado pelo ex-ministro de Bolsonaro, Tarcísio de Freitas (PL). Já outro ministro bolsonarista, Onyx Lorenzoni perdeu a disputa pelo governo do Rio Grande do sul para Eduardo Leite (PSDB), que foi reeleito.

Eleitores de Jair Bolsonaro choram e fazem oração durante anúncio de resultados da eleição no Brasil, com a vitória de Luiz Inacio Lula da SIlva, no Rio de Janeiro, em 30 de outubro de 2022.
Eleitores de Jair Bolsonaro choram e fazem oração durante anúncio de resultados da eleição no Brasil, com a vitória de Luiz Inacio Lula da SIlva, no Rio de Janeiro, em 30 de outubro de 2022. © Silvia Izquierdo / AP

“Deixem o Nordeste votar”

O domingo foi marcado por denúncias envolvendo o uso da máquina pública para impedir eleitores de votar, especialmente em localidades onde o apoio popular a Lula era maior. Apesar do TSE ter proibido a realização de operações de fiscalização de transporte, justamente para evitar que esse pretexto servisse para coibir eleitores de exercer seu direito ao voto, a Polícia Rodoviária Federal realizou mais de 500 blitz, sobretudo no Nordeste.

Há rumores de que o governo Bolsonaro teria escalado o ministro da Justiça para coordenar essa ação dos agentes rodoviários. A frase “deixe o nordeste votar” viralizou nas redes sociais. O presidente do TSE chegou a convocar o presidente da corporação, Silvanei Vasques, para uma reunião na corte eleitoral onde o ameaçou de prisão caso a operação não fosse suspensa. Apesar disso, Alexandre de Moraes não estendeu o prazo de votação.

Houve também denúncias de fiscalização da Polícia Militar em alguns estados, como no Rio de Janeiro, onde alguns locais tiveram fila de carros acima de 2 km. Comunidades indígenas e moradores de áreas mais afastadas, como regiões do Acre, disseram que não conseguiram ir até os locais de votação por falta de transporte público, ou porque os ônibus estavam passando em intervalos muito grandes, acima de três horas, diferentemente do que aconteceu no primeiro turno.

Nas redes sociais foram vários casos de pessoas relatando atuação da PM no sentido de convencer eleitores a votar em Bolsonaro, seja em operações de fiscalização de carro, seja em ônibus do transporte coletivo.

Desafio democrático

Após o último debate entre os dois candidatos, na TV Globo, Bolsonaro disse que aceitaria o resultado das urnas com um “leva quem tiver mais votos”. Mas essa tem sido uma das grandes preocupações de analistas e apoiadores de Lula devido a declarações repetidas do atual presidente e também a tensões que marcaram o fim da campanha.

Um dos episódios mais marcantes se deu no sábado, com a deputada reeleita Carla Zambelli (PL) correndo com uma arma em punho atrás de um jornalista negro por discordância política. O arsenal usado por Roberto Jefferson no ataque à Polícia Federal também elevou a preocupação sobre o que poderia vir com a vitória de Lula.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP/AL), aliado de Bolsonaro no Legislativo, disse que o resultado precisa ser respeitado. "O Brasil deu mais uma demonstração da vitalidade da sua democracia, da força das usas instituições, e do nosso povo. A vontade da maioria manifestada na urnas jamais deverá ser contestada. E deveremos seguir em frente na construção de um país soberano, justo e com menos desigualdades.”

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