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Linha Direta

"A gente tem expectativa de que realmente seja feita justiça", diz representante dos Krenak sobre julgamento da BHP em Londres

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Sete anos após a tragédia do rompimento da barragem de Fundão, próxima às cidades de Mariana e Bento Rodrigues, em Minas Gerais, a ação coletiva movida pelas vítimas no Reino Unido obtém uma nova vitória. A Alta Corte de Londres deve anunciar nas próximas horas a data do julgamento. A causa já somaria cerca de 10 bilhões de libras. O valor será cobrado do grupo de mineração anglo-australiano BHP, sócio da Vale na Samarco, dona do projeto que causou o maior desastre ambiental do Brasil. 

O rompimento da barragem de Fundão, em Minas Gerais, matou 19 pessoas, destruiu dezenas de casas e devastou a flora e a fauna do território da comunidade indígena Krenak, em novembro de 2015.
O rompimento da barragem de Fundão, em Minas Gerais, matou 19 pessoas, destruiu dezenas de casas e devastou a flora e a fauna do território da comunidade indígena Krenak, em novembro de 2015. Reuters
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Vivian Oswald, correspondente da RFI em Londres 

O caso bilionário contra a BHP deve ser um dos mais importantes já julgados pela justiça britânica. Os advogados de acusação passaram os últimos três anos tentando convencer a justiça britânica de que o julgamento poderia ocorrer no Reino Unido, onde a BHP tinha sede à época da tragédia, embora o acidente tenha acontecido no Brasil. Ter a data marcada, na avaliação dos advogados e vítimas, é o reconhecimento de que o caso segue adiante. 

Quando apresentada, três anos atrás, a ação - que envolvia 200 mil demandantes entre pessoas físicas, comunidades indígenas e quilombolas, empresas, igrejas e prefeituras - somava o equivalente a 5 bilhões de libras (cerca de R$ 33 bilhões).  Com o passar do tempo e o grande interesse despertado pelos avanços da causa no Reino Unido, a estimativa agora é a de que as indenizações passem de 10 bilhões de libras (cerca de R$ 66 bilhões). 

O aumento se deve à correção do montante pedido pelo valor dos juros mensais, de 1%, e o ingresso de cerca de cem mil novos demandantes. Os dados são escritório Pogust and Goodhead, que se ocupa do caso e se diz otimista em relação ao futuro.

Julgamento no Reino Unido

Tudo isso só aumenta o interesse pelo caso e atrai simpatizantes pela causa. O mais difícil, segundo um dos seus sócios, o advogado Felipe Hotta, era fazer a ação ser julgada no Reino Unido. Foi nisso o que o escritório se concentrou nesses últimos três anos.

Em entrevista à RFI, Hotta afirmou que os esforços despendidos meses últimos anos na discussão sobre a jurisdição do caso sensibilizaram a juíza responsável, que indicou querer celeridade para tratar do mérito da questão.

O julgamento, que deve acontecer até o início de 2024, segundo o escritório de advocacia, deve ser definitivo. Hotta reconhece que até cabe apelação nessa instância, mas afirma que as empresas não têm o hábito de fazê-lo.

O escritório quer que a BHP se solidarize com as vítimas e comece a pagar o mais rápido possível as indenizações dos grupos mais vulneráveis. Nesta quarta-feira (14), cinco representantes da comunidade indígena Krenak, uma das mais atingidas pelo desastre, foram convidados para uma audiência no parlamento britânico. Os deputados não têm como interferir no processo na justiça, mas podem apelar para que a BHP seja mais ágil para tentar um acordo. 

Comunidade Krenak está otimista

Alguns indígenas acompanharam pessoalmente as duas audiências da Alta Corte realizadas nestas terça (13) e quarta-feira. Não deram testemunho, nem participaram. Até porque esta fase era apenas para tratar de questões procedimentais. O mérito ainda não está sob questão.

À RFI, um dos representantes da comunidade Krenak, Marcelo Krenak se disse otimista. Ele afirma que acompanha todo o processo e sabe da sua morosidade no Brasil. "Na Inglaterra, onde tem até data marcada para o julgamento, o processo é mais rápido. E a gente tem a expectativa de que haverá mais equilíbrio, que a balança não tenderá para o lado mais forte”, explicou.

Krenak afirma que sua aldeia, com 600 indígenas, não foi contemplada em suas demandas. Segundo ele, as negociações foram conduzidas pelo governo e não ouviram as pessoas atingidas.

"O crime não aconteceu no dia 5 de novembro de 2015, quando a barragem rompeu. Acontece todos os dias desde então, quando crianças e jovens vêem que não têm acesso ao rio e que os mais velhos vivem de memórias”, diz.

O acidente liberou quase 40 milhões metros cúbicos de rejeitos minerais altamente poluentes, que percorreram 650 quilômetros pelo rio Doce até chegar ao oceano Atlântico. Pelo caminho, o tsunami de dejetos destruiu cidades, matou 19 pessoas e devastou a flora e a fauna no território dos Krenak. 

Marcelo comemora a data para o julgamento. "É uma grande vitória, sim, porque a gente tem uma expectativa de ficar confiante, de que realmente seja feita justiça e que o responsável pague pelos seus atos”, diz.

Reabertura do processo

Em novembro de 2018, o escritório de advocacia que até então e chamava SPG entrou com uma ação em um tribunal de Liverpool, no noroeste da Inglaterra, pedindo quase 5 bilhões de libras em indenizações. Mas, na época, o juiz entendeu que os demandantes não tinham o direito de processar na Inglaterra.

O caso foi encerrado em 2020. Um ano depois, os advogados conseguiram uma moção incomum para reabrir o processo e entraram com uma apelação. 

Em abril de 2022 a justiça inglesa se declarou competente para julgar o caso, embora o acidente tenha acontecido em outro país.

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