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França

Marine Le Pen pode surpreender na França, como Trump nos EUA?

 Desde que Emmanuel Macron e Marine Le Pen começaram a disputa para o segundo turno da eleição presidencial francesa, o ex-ministro da Economia é criticado por se comportar como vitorioso antes da hora. A atitude do centrista de 39 anos chegou a ser comparada à da democrata, Hillary Clinton, que também aparecia como “candidata do sistema”, mas que acabou perdendo para Donald Trump nos Estados Unidos, contrariando todas as pesquisas de opinião. Será que esse cenário pode se repetir na França?

Marine Le Pen e Donald Trump, que nunca se encontraram, têm a mesma ambição presidencial, mas muita coisa os separa.
Marine Le Pen e Donald Trump, que nunca se encontraram, têm a mesma ambição presidencial, mas muita coisa os separa. Fotomontagem/Reuters/Philippe Laurenson//Jonathan Ernst
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Antes mesmo da noite de domingo passado (23), quando foram definidos os nomes dos concorrentes para o segundo turno da eleição presidencial francesa, Emmanuel Macron já aparecia como vencedor em caso de disputa final com Marine Le Pen. Mas essa vantagem aumentou após o primeiro turno, com pesquisas de opinião que chegavam a apontar uma vitória do centrista, com mais de 60% dos votos no dia 7 de maio.

Empolgado com o resultado do primeiro turno, e também com os prognósticos, Macron disse que seu movimento Em Marcha! “mudou a cara da vida política francesa”, antes de ir festejar em um restaurante parisiense. A comemoração, aliás, foi vista por alguns críticos como uma decisão precipitada, tendo o candidato se comportado como se já tivesse sido eleito. No dia seguinte, os líderes europeus e o mercado financeiro adubaram ainda mais sua confiança, parabenizando o candidato pró-União Europeia e falando do centrista como se ele já fosse o presidente da França; sem esquecer os artigos apresentando a mulher de Macron, Brigitte Trogneux Macron, como se o país já tivesse escolhido sua primeira-dama.

Mas não demorou muito para as dúvidas surgirem. Um artigo do jornal norte-americano New York Times, datado de segunda-feira (24), questiona se a estratégia do “já ganhou” adotada pelo ex-ministro não seria precipitada. O diário chega a afirmar que “o pior inimigo de Macron seria a arrogância”, e compara o francês a Hillary Clinton, lembrando que a candidata democrata à eleição presidencial também aparecia como grande favorita, e acabou sendo derrotada por Donald Trump. Assim como Macron, a ex-secretária de Estado também era vista como a “candidata do sistema”, e contava com o apoio da comunidade internacional diante de um concorrente imprevisível.

Macron e Hillary Cliton não representam o mesmo eleitorado

Para o professor do Instituto de Ciências Políticas de Paris (Science-Po), Nicolas Sauger, mesmo se há alguns paralelos entre Hillary e Macron, muita coisa os separa. “Trump beneficiava do apoio dos Republicanos, um dos partidos históricos do panorama político dos Estados Unidos. Ele não era um outsider no tabuleiro político tradicional, como Marine Le Pen é na França”. Além disso, “mesmo se o eleitorado da Frente Nacional cresceu muito, principalmente nos últimos meses, ele representa apenas cerca de 20% dos franceses, o que faz com que Le Pen e Trump tenham bases bastante distintas”, prossegue.

Sauger, que é especialista em comportamento eleitoral, ressalta ainda que a percepção da imagem política de Macron e Hillary é muito diferente. “A democrata não encarnava a renovação, pois além do passado de sua família, tinha um exercício longo do poder político. Já o ex-ministro francês é uma figura relativamente nova”, pondera. Além disso, o professor lembra que havia muita desconfiança sobre a honestidade e a personalidade calorosa da ex-primeira-dama dos Estados Unidos. “No caso de Macron, podemos até ter dúvidas a respeito de sua estatura presidencial, mas ele, como pessoa, é pouco discutível pela maioria dos franceses”, continua.

O argumento de que Macron, que nunca foi eleito a nenhum cargo, não teria experiência suficiente, também voltou à tona de maneira discreta, mas insistente. O encontro tumultuado do candidato com operários de uma fábrica ameaçada de ser transferida para a Polônia, na terça-feira (26), suscitou questões sobre a capacidade do ex-ministro de administrar conflitos sociais e fez com que o centrista perdesse, em apenas um dia, 4 pontos percentuais nas pesquisas de opinião.

A corrida pelos votos de Mélenchon e Fillon

Outra questão que pode pesar nessa reta final é a distribuição dos votos dos eleitores do ex-premiê conservador François Fillon e do líder da esquerda radical, Jean-Luc Mélenchon, que representaram, cada um, cerca de 20% do eleitorado no primeiro turno. O ex-primeiro-ministro pediu que seus partidários apoiassem Macron para impedir que Le Pen chegasse ao poder. O conselho foi respeitado, pois uma pesquisa de opinião divulgada nesta quarta-feira (26) confirma que 47% dos eleitores do conservador pretendem votar no centrista.

Já do lado do líder da esquerda radical a situação é mais incerta. Mélenchon mantém o suspense e disse que vai consultar os membros de seu partido sobre uma possível indicação de voto para o segundo turno. O candidato, que parece não ter digerido a derrota, prometeu fazer uma declaração pública nesta sexta-feira (28).

Mas para Adélaïde Zulfikarpasic, diretora do instituto BVA, que realiza pesquisas de opinião sobre política na França, não se deve levar tão a sério as indicações dos candidatos perdedores. “Sempre dizemos que ninguém é proprietário de seu eleitorado e de seus votos. Os eleitores não seguem ao pé da letra as preconizações de votos de seus candidatos”, explica.E mesmo se Mélenchon preferiu não dar uma indicação de voto, “a maioria de seu eleitorado forma o que chamamos tradicionalmente de uma ‘frente republicana’ para bloquear a extrema-direita”, analisa. Aliás, uma pesquisa realizada pelo BVA nesta terça-feira (25) confirma essa tendência, pois apesar do silêncio do líder da esquerda radical, 52% de seu eleitorado pretende votar em Macron.

Já Nicolas Sauger lembra que “as indicações de voto geralmente são pouco respeitadas e são seguidas somente quando elas representam a intenção inicial dos eleitores”. O professor de Sciences-Po ressalta, porém, que em caso de hesitação, as preconizações de voto podem pesar contra ou a favor de um candidato. E é justamente esse eleitorado, indeciso ou que pretende se abster – e que representa mais de 30% entre os partidários de Mélenchon e de Fillon – que pode mudar o cenário do segundo turno da eleição presidencial francesa e que tanto Macron quanto Le Pen estão tentando conquistar até 7 de maio.

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